Engenharia 360

Como um projeto de Oscar Niemeyer acabou em Tragédia, mas Revolucionou a Engenharia?

Engenharia 360
por Simone Tagliani
| 20/05/2024 5 min
Imagem reproduzida de Cimento Itambé

Como um projeto de Oscar Niemeyer acabou em Tragédia, mas Revolucionou a Engenharia?

por Simone Tagliani | 20/05/2024
Imagem reproduzida de Cimento Itambé
Engenharia 360

Esta eu confesso que não sabia! É verdade, em 4 de fevereiro de 1971, o Brasil testemunhou uma grande tragédia, o desabamento do Pavilhão da Gameleira, em Belo Horizonte, cujo projeto era do renomado arquiteto Oscar Niemeyer. Esta história marcou uma geração e virou estudo de caso nas universidades. Muito além, levou a uma reflexão sobre as normas de segurança e o Código Penal. Saiba mais no texto a seguir, do Engenharia 360!

Oscar Niemeyer - Gameleira
Imagem de O Cruzeiro reproduzido de Estado de Minas

O episódio que envolveu a obra da Gameleira

O Pavilhão da Gameleira (Parque Bolívar de Andrade), onde abriga atualmente o Expominas, era para ser um dos maiores centros de exposições da América Latina, pensado para celebrar as conquistas de Minas Gerais.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

Seu formato era para ser como uma caixa de sapatos de 240 metros de comprimento e 7.820 m², com cálculos do engenheiro Joaquim Cardozo - que também trabalhou com Niemeyer na Pampulha e Conjunto JK, na capital mineira, além de outros projetos em Brasília. Infelizmente, tudo desabou durante sua fase final de construção. A tragédia resultou em 119 operários ficaram soterrados, 69 mortes e dezenas de feridos, marcando para sempre a história da construção civil brasileira.

Observação: No dia seguinte, na capa do GLOBO dizia "Pavilhão desaba: cem operários soterrados", contando ainda "sepultados por 10 mil toneladas de ferro e concreto armado". Já na matéria dentro do jornal, havia o depoimento do engenheiro Cardozo, que dizia estar tranquilo quanto ao seu trabalho, feito "rigorosamente dentro da técnica, tanto assim que as lajes caíram intactas", e que fora informado de "falhas nas fundações, ocorrendo o desabamento talvez pela ruptura do terreno".

O boato que surgiu na época é de que houve pressa da construtora responsável em terminar os serviços e inaugurar a obra, por conta do término do mandato do governador Israel Pinheiro. No processo, teriam sido ignorados vários alertas dos operários, que identificaram falhas na estrutura. E quando tudo veio abaixo, não foi só um abalo no setor da engenharia, mas na alma da cidade, deixando cicatrizes profundas na comunidade.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

Veja Também:

As principais obras de Oscar Niemeyer pelo mundo

As maiores obras do mestre Oscar Niemeyer no Brasil

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

As consequências e o apelo por justiça

De fato, tempos depois, as investigações apontaram essas falhas na execução da obra, como o não atendimento de algumas normas técnicas e a utilização de juntas de concretagem defeituosas. Também havia falhas na qualidade do material utilizado e erros na retirada das escoras de sustentação. A negligência e a falta de segurança durante a construção foram determinantes para o desabamento. Então, que fique claro, não foi culpa de Oscar Niemeyer.

Dizem os documentos sobre a retirada do escoramento: "O método utilizado, embora não tenha causado a ruptura, impediu que se avaliasse previamente o desempenho da estrutura, permitindo que o desabamento ocorresse de maneira imprevista".

Outra falha é que a obra até o dia da tragédia não tinha um engenheiro responsável pela execução. "A suntuosidade do empreendimento exigia que as decisões fossem concentradas em um profissional ou um grupo de profissionais dotados de grande capacitação técnica. Contudo, não havia um norte a seguir, desempenhando cada um dos réus suas atribuições como se fossem partes isoladas do conjunto da obra.", denuncia o laudo.

Oscar Niemeyer
Imagem de Antônio Carrera, Agência O Globo, reproduzido de Acervo O Globo
Oscar Niemeyer
Imagem reproduzida de Folha - UOL

Por incrível que pareça, em 2021, as famílias das vítimas desta tragédia da Gameleira ainda lutavam por indenizações, que não haviam sido totalmente concedidas (não temos informações sobre a situação atual). Aliás, o caso só chegou à Justiça em 1984. Pode-se chamar até de absurdo que toda a burocracia legal tenha prolongado tanto o sofrimento dessas pessoas, que, diferente de nós, ainda guardam muito bem na memória a lembrança desse triste dia.

Tomara que um dia possamos olhar para trás e ter a história do Pavilhão da Gameleira como exemplo de redenção, onde a justiça finalmente prevaleça.

A saber, em 2004, o governo de Minas foi condenado pela primeira vez a indenizar as vítimas, mas recorreu repetidas vezes. Em 2006, a segunda instância confirmou a sentença e negou o recurso do estado e da construtora. Em 2009, o caso chegou ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que, em 2016, também manteve o entendimento e responsabilizou o estado, que seria o responsável pela obra; a construtora seria uma prestadora de serviços. Ainda há um alerta da possibilidade de o caso prescrever.

Oscar Niemeyer
Imagem de O Cruzeiro reproduzido de Estado de Minas

As lições aprendidas e o legado da tragédia

É claro que nenhum arquiteto ou engenheiro trabalha desejando ver uma tragédia, ainda mais envolvendo seu trabalho - e penso que o mesmo pensava Oscar Niemeyer. Porém, desgraças acontecem. O que precisamos fazer é aprimorar os materiais, técnicas e processos adotados para que episódios assim não se repitam.

O que ficou claro é que era preciso reforçar os protocolos de segurança e acompanhamento técnico especializado. E assim foi feito. Normas mais rigorosas foram implementadas, procedimentos de segurança foram aprimorados e o debate sobre responsabilidade civil ganhou destaque, impulsionando uma reflexão profunda sobre ética e cuidado na construção civil.

A exemplo da criação da norma para lajes nervuradas. A NB-01, conhecida como a norma-mãe do concreto, hoje identificada como ABNT NBR 6118 – Projeto de Estruturas de Concreto – Procedimento. Por fim, as mudanças nos artigos 250 a 284, do Código Penal, que tratam das responsabilidades sobre desabamento e desmoronamento.

Todavia, sabemos que a prevenção nunca é demais, apesar do que diz a lei. Por isto, resolvemos resgatar este caso como um lembrete contínuo da importância da segurança na construção civil e da responsabilidade das autoridades em garantir o bem-estar de seus cidadãos.

Veja Também:


Fontes: G1, O Globo, Estado de Minas.

Imagens: Todos os Créditos reservados aos respectivos proprietários (sem direitos autorais pretendidos). Caso eventualmente você se considere titular de direitos sobre algumas das imagens em questão, por favor entre em contato com contato@engenharia360.com para que possa ser atribuído o respectivo crédito ou providenciada a sua remoção, conforme o caso.

Comentários

Engenharia 360

Simone Tagliani

Graduada nos cursos de Arquitetura & Urbanismo e Letras Português; técnica em Publicidade; pós-graduada em Artes Visuais, Jornalismo Digital, Marketing Digital, Gestão de Projetos, Transformação Digital e Negócios; e proprietária da empresa Visual Ideias.

LEIA O PRÓXIMO ARTIGO

Continue lendo