A tala elevada de reincidência de criminosos às prisões brasileiras é a prova de que alguma coisa está errada com a Arquitetura Penal do país. Mas uma maior contribuição engenheiros e arquitetos no planejamento desses complexos pode ser a resposta para mudar esta realidade.
Recentemente, foi publicado no Diário Oficial da União – portaria 21.073, do Ministério da Justiça – uma autorização, requerida por parte do Departamento Penitenciário Nacional para a contratação de mais profissionais. O interesse público é atender, de modo temporário, uma deficiência na construção civil brasileira, chamando 98 engenheiros – como especialistas técnicos – e 9 arquitetos – como analistas técnicos de obras – para trabalhar em projetos e acompanhamento de construções, reformas e ampliações de presídios e outros estabelecimentos de Arquitetura Penal.
Esse edital do Governo Federal, que esteve circulando nas mídias no mês de outubro de 2020, deve ser publicado na íntegra em até seis meses – ou abril de 2021. Mas o Engenharia 360 faz, antes, uma importante proposta de debate sobre por que é tão válido considerar a participação de arquitetos em planejamento de presídios. Continue lendo para saber mais!

Motivos que levaram o Brasil a repensar sua Arquitetura Penal
O sistema prisional mundial já passou por várias fases. Porém, só na era moderna é que se pensou em criar os primeiros abrigos exclusivos para apenados com privação de liberdade. Especialmente o Brasil, que desde o período colonial tenta superar as suas falhas. O primeiro código penal até mencionava certa preocupação quanto à qualidade dos espaços penitenciários construídos. Todavia, algumas discussões perderam força ao longo dos séculos. E, hoje, o país enfrenta uma situação de precariedade bastante séria da sua estrutura carcerária.
Novos olhares
Acredita-se que, se algumas mudanças, a começar na Lei de Execução Penal, fossem realizadas, a Arquitetura Penal brasileira viria a ser outra, de modo a contribuir mais positivamente para o apenado. Seria importante, por exemplo, que os presos pudessem ter um melhor convívio social; também, que eles fossem estimulados à educação e ao trabalho; ou que, pelos menos, as suas celas tivessem condições mínimas de garantir uma melhor saúde física e psicológica.
Para mudar a realidade atual, as instalações penais no Brasil precisariam melhorar e muito. Infelizmente, hoje, é difícil demais uma pessoa cumprir a sua sanção de maneira realmente eficaz. O Art. 10 da LEP ainda ressalta que “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”. Contudo, enquanto o índice de reincidência do mundo é de 20%, por aqui, a taxa alcança 70%. E pode ser que investir em mais arquitetura seja a única esperança de baixar este número.
“Quando você diz que o espaço prisional é um espaço com o qual não devemos nos preocupar, você está segregando uma parte considerável da população. Mas é preciso lembrar que essas pessoas vão voltar para a sociedade e impactar de alguma maneira as nossas vidas.”
– arquiteta Suzann Cordeiro, em reportagem de Casa e Jardim.

Principais desafios dos projetos de Arquitetura Penal
A primeira coisa que os arquitetos precisam pensar, no momento de elaborar uma proposta de presídio, é a localização desse complexo, pois isto deverá impactar no próprio cotidiano dos apenados, policiais, advogados entre outros. Para começar, a orientação solar do edifício.
Outra coisa importante é a construção do programa de necessidades para o projeto. Embora a legislação atual permita uma flexibilização disso – Resolução Nº 9 / 2011 -, é possível pensar melhor nos espaços como cozinhas, lavanderias, áreas de trabalho e locais de visita – principalmente levando em consideração o número de presos na instituição.
Estrutura
Quando se trata de Arquitetura Penal, o padrão de construção precisa ser outro, bem mais elevado. O projetista deve considerar a hipótese de que qualquer elemento inserido na sua proposta venha a ser, no futuro, utilizado como arma.
Portanto, não são quaisquer materiais que poderão servir de revestimento. Na verdade, eles precisarão ser mais resistentes e não inflamáveis. E as estruturas em concreto, por exemplo, deverão ter a sua armação de ferro mais reforçada, instalada longe da superfície externa – pois os presos gostam de tirar os vergalhões. Além disso, é possível considerar o uso do concreto vitrificado em algumas partes da edificação.

Interiores
Para melhorar a conduta dos presos e evitar mais infrações, muita coisa pode ser melhorada nas estruturas penais do Brasil. Antes de colocar qualquer ideia no papel, o arquiteto deve pesquisar o perfil dos criminosos que utilizarão as instalações por ele projetadas.
Os ambientes dos presídios devem ter tamanho proporcional à quantidade de presos previstos para a instituição – mesmo que não existam normas legais que determinem a quantidade de pessoas por cela. O layout do edifício, no geral, deve evitar a superlotação dos espaços, garantir melhor monitoramento, além de ajudar a manter a ordem e a disciplina de todos.

As celas realmente não precisam ser muito grandes; suas janelas precisam ser gradeadas e ficar em um nível acima da cabeça dos presos – uma referência também para o pé-direito; e as camas devem ser intercaladas, para que uma pessoa, ao se levantar, não fique de frente para a outra. Muros e divisórias precisam ser altos. Corredores devem ser largos; já os pátios, estreitos e virados para uma orientação que favoreça os banhos de sol. Todos os ambientes devem ser revestidos de material de fácil e rápida limpeza e manutenção. E é melhor que as tonalidades dos revestimentos sejam mais alegres, pensando na questão da psicologia ambiental.


Casos de sucesso fora do Brasil que servem de referência
Como é de se imaginar, a situação da Arquitetura Penal fora do Brasil é bem diferente. Em certos países, os presídios parecem até hotéis de luxo. Acredita-se que, em grande parte, este seja o motivo da menor taxa de reincidência dos presos, além de sua convivência mais pacífica durante o tempo de cárcere. Nestes locais, as instalações são super confortáveis. Todos os apenados trabalham, se profissionalizam, fazem exercícios físicos e participam de programas educativos.
Em Bastoy, na Noruega, os presos vivem em casas-prisão e trabalham em fazendas. Já em Loben, na Áustria, os presos ficam em celas com banheiro privativo e pequena cozinha. Na prisão de Aranjuez, na Espanha, há creches para as crianças, que ficam com os pais – pai e mãe, numa cela de 150m² – até os 3 anos de idade, com direito a bercinho e tudo. E voltando à Noruega, Halden é considerada a instituição penal mais humana e luxuosa do mundo – com muitas áreas recreativas e biblioteca, além de celas com vistas panorâmicas para uma floresta abundante.

Fontes: O Antagonista, Metrópoles, Revista Casa e Jardim, JUS, Mega Curioso, Vitruvius, AC24horas.
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Simone Tagliani
Graduada em Arquiteta & Urbanismo e Letras; especialista em Artes Visuais; estudante de Jornalismo Digital e proprietária da empresa Visual Ideias - Redação, Edição e Produção de Conteúdos.