Veneza, no noroeste da Itália, é uma das cidades mais lindas do mundo, bastante admirada pelos turistas por conta da sua arquitetura única. Mas o que intriga os engenheiros é a história de como ela foi construída, desafiando a compreensão sobre estruturas. Além disso, seus canais, que permeiam o tecido urbano com ruas aquáticas, dão a impressão de que a cidade está flutuando sobre a água. Neste artigo do Engenharia 360, vamos explorar como os romanos transformaram centenas de ilhas em um dos locais mais icônicos do mundo. Confira!
O contexto histórico da origem de Veneza
Antes de Veneza ser construída, ainda no século V d.C., essa região italiana era apenas um pântano. Mas foi justamente nessas ilhas arenosas (a exemplo de Torcello, Jesolo e Malamocco) que os bárbaros encontraram refúgio contra os bárbaros (especialmente visigodos e hunos liderados por Átila) que invadiam e assolavam zonas pertencentes ao Império Romano. Os assentamentos, que eram para ser temporários, se tornaram lares permanentes e se transformaram com o passar dos anos.
Vale destacar que essa evolução foi impulsionada pela localização estratégica da cidade na lagoa, que colocava Veneza como ponto central na rota comercial entre o Oriente e a Europa Ocidental. Desse jeito emergiu a grande potência marítima global e centro comercial vital para a Europa. Entre os séculos IX e XI, a região passou a integrar a Rota da Seda; mercadorias chegavam no porto e eram redistribuídas por todo o continente. Essa posição privilegiada favoreceu o crescimento econômico local.
A saber, hoje, a economia de Veneza é baseada principalmente no turismo. Contudo, ela também inclui outros setores, como construção naval, exportações industriais, produção de cristal e pesca.
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A construção da cidade em solo inóspito
Como dito antes, Veneza foi construída sobre um arquipélago formado de pequenas ilhotas, agora conectadas por pontes e passagens em forma de canais que variam de 1 a 5 metros. Para tornar essa região habitável, os engenheiros do passado tiveram que desenvolver novas técnicas de construção - que mesmo hoje são usadas ou inspiram o desenvolvimento de tecnologias. O desafio maior era o terreno ser pantanoso.
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A solução adotada para o caso foi o uso de palafitas de madeira. Os romanos enterraram troncos de árvores sob as águas da lagoa para servir como pilares sustentadores das edificações. Estes troncos eram afunilados em uma das extremidades para que pudessem ser cravados no solo lodoso até atingirem as camadas mais sólidas da terra. E deu certo, esse modelo de engenharia permitiu que as estruturas se mantivessem firmes apesar da instabilidade do terreno.
Preservação da madeira
Talvez a coisa mais interessante na engenharia de Veneza é que a sua madeira (predominantemente de árvores como amieiro, muito resistente à água) não apodreceu ao longo dos séculos. Isso porque os troncos ficaram completamente submersos, sem acesso ao ar e, portanto, sem contato com organismos que causam a decomposição do material. Além disso, essa madeira ainda absorveu minerais presentes na água, o que levou a um processo de fossilização que aumenta sua durabilidade.
Importante dizer que, sobre essas estacas, foram construídos blocos de pedra. Essa é a verdadeira fundação para os edifícios de Veneza.
A transição para materiais mais duráveis
Durante o século XI, Veneza enfrentou ataques de piratas que ameaçavam as rotas comerciais da costa da Dalmácia. Mas a estabilidade do seu comércio e a segurança dos seus moradores foi garantida graças ao exército romano. Finalmente, sua posição como um dos principais polos comerciais do Mediterrâneo pôde ser consolidada, levando a importantes alianças comerciais. Assim, a cidade se tornou independente, desafiando as tentativas de controle do Império Bizantino e Mongol.
Naquele tempo, uma das contribuições mais importantes para o crescimento econômico de Veneza foram as expedições realizadas por Marco Polo. Sua jornada ao Oriente ajudou a abrir novas rotas comerciais e a expandir o conhecimento europeu sobre regiões como Ásia Central e China.
Nos séculos seguintes, Veneza foi ficando cada vez mais próspera, expandindo-se sobre as águas. No começo, as edificações eram erguidas mais nas áreas secas das ilhas e eram feitas de madeira. Porém, a população da cidade cresceu e novas técnicas de construção foram utilizadas. Os venezianos começaram a aterrar as áreas alagadas, criando novos espaços de habitação. E, enfim, passarelas suspensas tornaram-se comuns à medida que os canais foram sendo estreitados pelas próprias construções. Foi uma expansão desordenada que até hoje traz desafios.
Problema com as enchentes
Por volta do século X, pedras começaram a ser incorporadas nas fundações e nas margens dos canais para ajudar na estabilidade das estruturas das edificações. As primeiras obras de pontes surgiram no ano de 1170. Mas há séculos, quando o nível do Mar Adriático sobe, a cidade sofre com enchentes - que hoje chegam a alcançar quase um metro em algumas localidades. O solo lamacento também vem afundando gradualmente desde os anos de 1890, "empurrando" a cidade para baixo.
Depois das enchentes, sedimentos ficam acumulados nos canais de Veneza, o que aumenta o risco de transbordamentos - fenômeno conhecido na engenharia como assoreamento. Também as ondas provocadas pelos inúmeros navios de cruzeiro que chegam à costa não ajudam; esse tráfego marítimo tem desgastado os pilares de madeira das casas à beira da água. Para completar, as mudanças climáticas elevaram o nível de risco; prevê-se que 80% das costas arriscam desaparecer até 2050.
Para se proteger das enchentes, o governo de Veneza construiu nas últimas décadas barreiras gigantes que ficam no fundo do mar e são erguidas quando há risco de inundação. A cidade também tem um sistema de pequenas barragens com bombas para manter secas as áreas mais importantes, como a Praça de São Marcos.
A arquitetura e o legado cultural de Veneza
A história urbana e de construção de Veneza é tema de estudo para a arquitetura. Seus palácios são a representação concreta da interação entre orientais e ocidentais, refletindo a diversidade cultural trazida pelo comércio. Não à toa, a cidade é considerada Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO desde 1987. Para muitos ao redor do mundo, tal região da Itália é exemplo de obra-prima da humanidade, prova de que é possível transformar áreas alagadas em estruturas icônicas de engenharia.
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Fontes: National Geographic Brasil, ArchDaily, BBC, Superinteressante.
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