Em 26 de abril de 1986, o mundo testemunhou o pior desastre nuclear da história na usina de Chernobyl, localizada na Ucrânia. Na ocasião, houve uma liberação massiva de radiação que causou a contaminação de uma vasta área ao redor da infraestrutura. E mesmo hoje, décadas após o desastre, esse ambiente ainda permanece hostil. Chama a atenção dos cientistas os impactos do acidente sobre a vida local. Foi observando essa evolução que pesquisadores fizeram uma descoberta surpreendente que pode até mesmo mudar os rumos da exploração espacial.
Hoje, sabe-se que existem fungos radiotróficos habitando a usina e se alimentando de seu reator nuclear. Ou seja, eles não apenas sobrevivem à radiação, mas também prosperaram nela, absorvendo-a e convertendo-a em energia química - uma capacidade única que desafia as convenções científicas. O objetivo é entender esse processo melhor e usar depois o conhecimento em situações em que necessite de proteção contra radiação. Saiba mais sobre o caso no artigo a seguir, do Engenharia 360!
O que são fungos radiotróficos?
Os fungos radiotróficos são um tipo de organismo que consegue se alimentar da radiação através de um processo chamado radiossíntese. A saber, esse processo é análogo à fotossíntese das plantas, onde a luz solar é convertida em energia. Mas no caso desses fungos, a radiação gama é o que serve de fonte de energia. E, a título de curiosidade, esses pequenos seres vivos contêm altos níveis de melanina, pigmento que permite a absorção da radiação.
A descoberta dos fungos de Chernobyl
Cinco anos depois do desastre, os cientistas já encontraram fungos radiotróficos crescendo nas paredes do reator destruído. Essa descoberta chamou a atenção até mesmo da NASA. Foi seu pesquisador Kasthuri Venkateswaran que notou que um dos fungos, o Cryptococcus neoformans, possui melanina - que em humanos é responsável pela pigmentação da pele -; e que, assim, esses organismos podem transformar energia eletromagnética em formas de energia utilizáveis, oferecendo um modelo fascinante para proteger contra a radiação.
Quais as possíveis aplicações dos fungos radiotróficos?
Os fungos radiotróficos podem oferecer muitos benefícios à ciência. Vamos começar com exemplos mais próximos da nossa realidade. Aqui na Terra, inúmeros profissionais se expõem constantemente à radiação, como os profissionais de saúde que operam máquinas de raio-X. Para sua proteção, são usados os aventais de chumbo. No entanto, o uso de melanina extraída de fungos radiotróficos nesses "escuros-protetores" pode ser uma alternativa mais leve e eficiente.
Detalhe: esses fungos têm uma capacidade de se autorreplicar e regenerar. Isso torna sua produção em larga escala, com foco em tecnologias de proteção contra radiação para diferentes indústrias, relativamente fácil.
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Outra ideia para uso de melanina de fungos radiotróficos seria para trajes espaciais. Sua proteína poderia ser muito bem utilizada no espaço, como uma forma de proteção mais natural contra níveis perigosos de radiação cósmica que os astronautas precisam enfrentar em missões de longa duração - a exemplo do que deve vir a ser enfrentado por eles nas missões programadas para Marte nos próximos anos. A saber, essa radiação pode afetar suas capacidades cognitivas e físicas ao longo do tempo.
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Experimentos na Estação Espacial Internacional
Na década passada, pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, enviaram para a Estação Espacial Internacional (ISS) um material experimental feito com melanina extraída de fungos de Chernobyl. Uma parceria entre os cientistas da Escola de Saúde Pública e da NASA foi firmada para a investigação desses seres vivos em condições especiais para a criação de escudos biológicos protetores contra radiação.
Os resultados iniciais mostraram que esses organismos conseguem sobreviver no ambiente de microgravidade, demonstrando uma notável capacidade de bloquear radiação. A espessura da placa de Petri que continha uma amostra de 2 cm de fungo, conseguiu barrar 2% da radiação incidente. Isso sugere que uma capa com 21 cm, por exemplo, seria suficiente para proteger humanos da radiação gama no espaço.
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Podemos pensar alto! Imagine colônias no 'Planeta Vermelho' com paredes revestidas com esses fungos, ajudando a mitigar os efeitos nocivos da radiação, que são mais intensos devido à atmosfera rarefeita local.
Qual a perspectiva para a implementação da tecnologia?
Apesar das promessas, existem desafios significativos na implementação dessa tecnologia. O problema é que o ambiente marciano é extremamente frio e seco, o que dificultaria o crescimento dos fungos. Uma alternativa seria criar um sistema de irrigação para esses organismos com água extraída do gelo lunar ou do gelo presente nos polos marcianos - mas não seria trabalhoso demais?
A questão é que alguns cientistas estão olhando além, imaginando se esses fungos não podem ser usados em outras áreas. Afinal, sua habilidade de transformar radiação em energia química pode abrir portas para novas formas de geração e armazenamento de energia - e radiação é, sem dúvidas, um recurso amplamente disponível no espaço. No fim, essa tragédia Chernobyl pode ser transformada em uma importante lição, impulsionando avanços científicos.
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Fontes: Aventuras na História, Superinteressante, Mega Curioso.
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Eduardo Mikail
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