Espaços públicos abertos, livres de edificações e circulação de trânsito, são por suposição mais acessíveis a todos os cidadãos, dando maior autonomia aos indivíduos e grupos, podendo ser democráticos e abrigar diversidade. Baseado nesses princípios surgem os parques urbanos. Como um dos maiores exemplos de parques urbanos no Brasil, está o Parque Ibirapuera, centro de cultura, lazer e esportes, um grande espaço arborizado, numa cidade tão cinza quanto São Paulo.
O Surgimento dos parques urbanos
A ideia de parque surge na Europa, no momento da Revolução Industrial, como alternativa verde e recreativa para a sociedade. Mais tarde, alia-se a essas razões a noção de embelezamento urbano.
Com o intuito de seguir os padrões Europeus, inspirados em parques como o Hyde Park, em Londres, e buscando reconhecimento internacional para a cidade de Nova York, em meados do século XIX, ricos comerciantes e proprietários de terra, pressionaram o governo para a criação de uma área de recreação e lazer na cidade. Entre a definição do local e a construção, foram por volta de 6 anos e, no inverno de 1859, o Central Park foi inaugurado para o público nova-iorquino.
No Brasil, com as motivações invertidas, ou seja, primeiramente buscando o embelezamento urbano e depois pela necessidade de alternativas verdes de lazer, os parques surgiram um pouco mais tardiamente do que na Europa e EUA – assim como ocorreu com a Revolução Industrial.
Em São Paulo, apenas a partir da década de 1970 que há uma maior valorização do lazer, fazendo com que surja uma política de implementação de parques municipais que fossem mais voltados para o uso esportivo e recreativo.
O Parque Ibirapuera
Inaugurado em 1954, o Parque Ibirapuera teve inicialmente seus jardins desenhados pelo paisagista Otávio Augusto Teixeira Mendes e suas construções históricas, como os pavilhões que abrigam museus, o auditório e a marquise, concebidas por ninguém menos que Oscar Niemeyer, com projetos estruturais do engenheiro Joaquim Cardozo. Posteriormente, conforme as demandas da população vinham surgindo, o parque foi sendo adaptado a essas necessidades, levando a um “ponto de saturação” e ao indispensável Plano Diretor para auxiliar na resolução de conflitos.
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A gestão do parque, assim como sua administração, fica a cargo da Prefeitura de São Paulo. No entanto, a partir de 2014, o Parque Ibirapuera, passou a contar também com uma associação de amigos consolidada, de nome “Parque Ibirapuera Conservação”, que se dispõe a estimular o uso consciente dos equipamentos públicos pelos usuários, restaurar espaços e promover a melhoria das áreas verdes e abertas.
Como funciona a região do Central Park?
O parque americano possui o dobro do tamanho do brasileiro, mas isso não dificultou seu desenvolvimento, nem sua transformação em ponto turístico internacionalmente conhecido. O Central Park, em seu pior momento, recebeu um número de visitantes próximo aos que o Parque Ibirapuera recebe atualmente.
Acontece que, na década de 1970, o parque nova-iorquino estava abandonado, sem as manutenções municipais e sofrendo com a violência. Incomodados com essa situação, um grupo de vizinhos bancou um estudo cujo objetivo era a recuperação do local. Desse grupo surgiu uma ONG que até hoje é responsável pela gestão do parque e por três quartos dos custos dele. Diferentemente do Brasil, os EUA têm uma cultura muito forte de filantropia. Só o Central Park possui mais de 40 mil contribuintes através da Central Park Conservancy.
Tanta dedicação trouxe o parque de volta e junto dele muitos visitantes. A movimentação da área motivou a prefeitura de Nova York a leiloar terrenos e permitir construções cada vez maiores, inclusive recebendo como contrapartida dos incorporadores, novos parques e a manutenção deles. Nas imediações do parque, por exemplo, há terrenos que possuem coeficiente de aproveitamento igual a 14, ou seja, é permitida a construção com área 14 vezes o tamanho do seu terreno.
Uma das maiores fontes de arrecadação da cidade de Nova York, o Central Park arrecada anualmente mais de 1,5 bi de dólares com imposto territorial, locações para imagens para diferentes fins e gastos do público no parque, sendo o imposto responsável por mais de 50% desse valor. Além disso, quase 40% das vagas em hotel da cidade ficam próximas ao parque.
Por que não é possível reproduzir o modelo no Ibirapuera?
A limitação de recursos para investimentos no Parque Ibirapuera e as leis que protegem o parque e a região não permitem que ela se desenvolva como na cidade americana. Tombado pelas 3 esferas da federação, o Ibirapuera possui legislação rígida que limita as atividades em seu interior e no entorno.
Ao observar a legislação urbana de São Paulo, vemos que os zoneamentos da região só permitem construções de áreas até uma vez o tamanho do terreno. Para alguns zoneamentos pode-se chegar até 4 vezes mediante a uma outorga onerosa. Fato é que, para toda a cidade de São Paulo, o caso se repete. O valor máximo de coeficiente de aproveitamento é igual a 4 e isso não é muito diferente no resto do Brasil.
Nosso país não possui uma cultura de grandes arranha céus. Pouquíssimas cidades destacam-se nesse quesito, e uma delas é Balneário Camboriú. A cidade localizada no litoral do estado de Santa Catarina possuía, até o começo desse ano, 5 entre os 10 edifícios mais altos da América do Sul, sendo 6 dos 10 maiores prédios do Brasil, ocupando inclusive a primeira posição do ranking brasileiro. Para tanto, a cidade oferta números altos de coeficiente de aproveitamento, além de gabarito livre.
Tanto estímulo movimentou o nicho de apartamentos de altíssimo padrão, e criou uma competitividade entre as empresas, que buscam sempre o maior e mais luxuoso prédio da cidade. Essas características fizeram com que Balneário Camboriú recebesse o apelido de “Dubai Brasileira”. Mas a cidade Catarinense encontra-se quase solitária nesse quesito no Brasil.
Desde 2017, a Prefeitura da cidade de São Paulo iniciou um movimento buscando melhorar o Parque Ibirapuera e demais outros através do setor privado, com o objetivo também de desonerar a máquina pública. A ideia da prefeitura é uma Concessão Pública de prestação de serviços para os próximos 35 anos.
Desde então, vem sendo elaborado um novo Plano Diretor para o parque, contando inclusive com consultas públicas, sendo a última realizada agora no mês de agosto. Essas consultas foram uma exigência do Ministério Público Estadual, atendendo as preocupações da população de que, antes dessas concessões, deveria ser aprovado esse novo Plano Diretor, contendo as normas e procedimentos que direcionariam as ações, usos e cuidados com o Parque, mantendo sua essência de equipamento público como ferramenta de preservação ambiental, cultural e de lazer para os cidadãos.
Ainda assim, o novo Plano está aquém no que se refere a paridade do parque com seu irmão americano. Ainda haverá muitas limitações de seu uso quando se trata de eventos diferentes do usual, incluindo seu uso para locação publicitária, que deve sempre atender aos horários de funcionamento do Parque.
Pode-se perceber, portanto, que para alcançar o “status Central Park”, o Parque Ibirapuera ainda necessita de muitas mudanças, que não dependem apenas do poder público, mas também de toda a população, a começar pela grande diferença de que o parque brasileiro é gradeado e fechado com portões, enquanto o americano tem livre acesso a qualquer momento. Assim como lá atrás a população nova-iorquina buscou revitalizar e proteger seu grande parque, é necessário que haja esse espírito de preservação e cuidado com a coisa pública também nos brasileiros.
Referências: Novo Plano Diretor, Administração Central Park, Modelo impedido por leis, Quadro zoneamento SP, Central Park, Balneário Camboriú
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E aí? Você concorda que a região do Ibirapuera deveria se desenvolver mais, atraindo mais a população e o turismo, ou acredita que o parque já está no rumo certo e deveria ser preservado cada vez mais?