Engenharia 360

O PL 3081/2022 e suas consequências para a profissão de engenheiro: opinião de um especialista

Engenharia 360
por Redação 360
| 13/02/2023 | Atualizado em 03/05/2024 6 min
Imagem de Agência Senado em Flickr

O PL 3081/2022 e suas consequências para a profissão de engenheiro: opinião de um especialista

por Redação 360 | 13/02/2023 | Atualizado em 03/05/2024
Imagem de Agência Senado em Flickr
Engenharia 360
O PL 3081/2022 e suas consequências para a profissão de engenheiro: opinião de um especialista
Imagem de Paulo Vitale©All Rights reserved

É com enorme prazer que o Engenharia 360 entrevistou o presidente do CREA-SP, Vinicius Marchese, para debater sobre um tema de tamanha importância na atualidade, o PL 3081/2022 e a valorização profissional daqueles que atuam com as engenharias e áreas afins.

Certamente, todos conseguem perceber que vivemos um momento muito delicado em nossa sociedade, onde estamos praticamente tendo de combater a “epidemia da desinformação”. Pessoas sem qualquer conhecimento sobre certos assuntos se sentem na total liberdade de avançar sobre questões delicadas, questionando com base no verdadeiro nada.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

Não é de agora que, em sociedade, refletimos e discutimos certos assuntos assim. De fato, tem muitas histórias; há muito tempo de disseminação de mentiras, de discursos que insuflam o conflito entre os mais diversos atores com voz pública que acabam alimentando a ideia de que não é relevante o papel do engenheiro, do arquiteto, etc. Que suas atividades podem ser desempenhadas por qualquer um, sem acompanhamento técnico e fiscalização.

Inclusive muitos acreditam, de modo bastante distorcido, que sindicatos e conselhos são meros cabides de emprego, quando sabemos que são justamente responsáveis por acompanhar a conduta dos profissionais para não violarem normas técnicas e disciplinares, evitando até mesmo crimes que possam nos prejudicar, e prejudicar a segurança de nossas vidas. Só o fato de se cogitar um projeto de lei como o PL 3081/2022 é grave!

1. Como profissionais das Engenharias, o 360 recebeu com muito espanto esta notícia do Projeto de Lei 3081/2022. Antes de tudo, gostaríamos de saber sua opinião como uma figura política experiente e importante em nossa sociedade. É comum que propostas como esta cheguem à Câmara?

"Qualquer deputado, representante do Legislativo ou do Executivo ou movimento social pode propor um projeto de lei como o PL 3081/2022. Portanto, é comum que surjam propostas inusitadas. Mas, o que me deixa surpreso é que, como neste caso, trata-se de um projeto de lei que parte de ações totalmente unilaterais, sem consulta aos profissionais ou à sociedade e contrário ao pleito da própria classe, que vem reivindicando por valorização."

2. A nossa próxima dúvida é qual o impacto para a sociedade com este PL 3081/2022, sobretudo o comprometimento da valorização dos engenheiros em um possível cenário de aprovação?

"Primeiro, importante dizer aqui sobre a inviabilidade desse projeto."

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

"Não acredito que essa matéria vá para frente. O próprio deputado que o apresentou, Tiago Mitraud (Novo), o fez ao apagar das luzes do ano legislativo e ao fim de seu mandato. Ou seja, não há base nem mesmo para defesa do PL 3081/2022."

"Agora, a proposta em si é uma verdadeira ameaça à segurança da sociedade. Isso porque revoga a Lei 5.194, de 1966, que dispõe sobre a regulamentação das profissões das Engenharias, Agronomia e Geociências e exige que engenheiros, agrônomos e geocientistas tenham formação técnica e sejam habilitados por Conselho para atuar. Sem isso, qualquer um poderia exercer uma atividade técnica como projetar e construir prédios, manipular defensivos da cadeia produtiva agrícola, montar redes elétricas, gerenciar o trânsito terrestre, marítimo e aéreo etc."

"Estamos falando de atividades específicas que requerem preparo e conhecimento. Imagine deixar esses trabalhos na mão de executores leigos, o risco ao qual estaríamos expostos."

"Vemos constantemente as graves consequências disso nos noticiários, quando construções irregulares - ou mesmo as regulares que já não passam por manutenções - vêm ao colapso, protagonizando incêndios, rupturas, entre tantos outros problemas. Costuma-se dizer na área tecnológica que um médico-cirurgião expõe ao risco um paciente por vez, já um engenheiro civil pode comprometer a segurança de toda uma sociedade quando comete um erro numa projeção de um viaduto, uma ponte ou um prédio."

"Para além dessas questões, é preciso ter em mente ainda o quanto a área tecnológica contribuiu e segue contribuindo para o desenvolvimento de nossas cidades, estados e país, buscando soluções para os problemas que afetam a vida das pessoas e promovendo alternativas sustentáveis que visam o bem-estar de todos e promovam uma vida mais digna. Com isso, fica claro que a regulamentação dos profissionais é fundamental e desregulamentá-las seria um retrocesso em todos os sentidos e não apenas pelas profissões das Engenharias, Agronomia e Geociências, como também por todas as outras que são alvo do PL 3081/2022. Por outro lado, temos segurança de que os parlamentares terão a consciência necessária dos riscos que esse tipo de proposta acarreta."

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

"O Sistema CONFEA/CREA está em constante diálogo com o Legislativo e monitora de perto qualquer iniciativa que seja de interesse ou tenha impacto para a área tecnológica."

3. Podemos dizer que, hoje, a graduação é a prova mínima para a seleção de qualificação desses profissionais. Sem isso, como o Brasil poderia manter e até aumentar o rigor de fiscalização?

"De forma alguma. Sem a regulamentação das profissões e com a revogação da Lei 5.194/1966, o Sistema CONFEA/CREA também deixaria de existir."

"Muitos ainda enxergam o Conselho como um obstáculo, o que é um erro, pois é ele que garante a fiscalização do exercício profissional e comprova que as atividades técnicas estão sendo desempenhadas por profissionais devidamente habilitados e registrados para tal."

"Veja o exemplo do Crea-SP, nos últimos sete anos aumentamos em mais de 1.600% o volume de operação de fiscalização no estado de São Paulo. Isso quer dizer que a atividade profissional está sendo cada vez mais observada e a sociedade ganha, com isso, uma garantia maior de segurança, já que estamos afastando os leigos e combatendo o mau exercício profissional."

4. Você acredita que tal proposta tenha sido embasada em um estudo sério, inicialmente com alguma lógica? Ou foi simplesmente uma manobra de um político para chamar atenção e ter o seu nome mais divulgado nas mídias?

"Claramente não houve embasamento para este PL 3081/2022. Nossas reivindicações do Sistema CONFEA/CREA provam isso. No ano passado tivemos a 11ª edição do Congresso Nacional de Profissionais (CNP), onde cada Conselho Regional realizou as etapas regionais e estaduais antes do encontro nacional para levantar o que o profissional tem de necessidade de melhoria para sua atuação."

"A cada três anos fazemos isso e em momento algum houve questionamentos sobre a regulamentação. Pelo contrário, o engenheiro, agrônomo e geocientista quer a valorização de sua profissão. A situação da apresentação da proposta por si só já diz muito sobre a real intenção com este PL 3081/2022."

5. Podemos, então, considerar que um projeto absurdo como este, se aprovado, levaria o Brasil - educação, economia e desenvolvimento - ao retrocesso? O que aconteceria com tantos estudos e práticas, como as conduzidas pelo Crea-SP, para proteção e valorização profissional?

"Por qualquer ângulo que olharmos, esse projeto representa um verdadeiro e enorme retrocesso. Como comentei anteriormente, sem a regulamentação não haveria garantia da formação técnica para o exercício profissional e, com isso, a fiscalização não teria meios de comprovar a habilitação dos profissionais para que possam atuar."

"Fora isso, o tanto que avançamos em valorização, em iniciativas coletivas em prol do desenvolvimento e todo o reconhecimento construído para os profissionais estariam também ameaçados. No Crea-SP, por exemplo, só para falar sobre o aspecto da capacitação, temos o Crea-SP Capacita, um programa robusto para aprimoramento e atualização profissional, com cursos acessíveis em entidades parceiras e renomadas."

"O Sistema CONFEA/CREA perderia sua principal razão de existir, que é a fiscalização, e os profissionais não mais poderiam contar com este amparo para atuação, proteção e capacitação. Toda essa estrutura é desenvolvida para amparar, proteger e defender o exercício profissional."

6. Como o Crea-SP e outros órgãos profissionais (como o CAU, que o senhor tenha conhecimento) estão lidando com a apresentação deste projeto de lei? Até mesmo, como será que o mundo político (outros deputados) recebeu tal notícia? E quais medidas já foram tomadas para impedir que esse pedido siga adiante no órgão legislativo?

"O que deve ser feito agora é isso, conscientizar a população e os profissionais dos riscos desta proposta e dialogar com os representantes que estão em mandato para que não haja o prolongamento de uma proposta tão infundada e que em tanto afeta à segurança da população.

"Nossos esforços, como um todo, devem ser voltados para as questões que realmente têm potencial de promover desenvolvimento, como a atualização das leis regulamentadoras e não sua extinção. Estamos vigilantes e, através do trabalho coordenado pelo Confea, prontos para defender as categorias ameaçadas."

7. Agora, para terminar, entramos em outro assunto polêmico, o EAD. É sabido que o governo já deu aprovação para que várias profissões, que necessitam de instrução prática e séria, possam ter os seus ensinos total ou parcialmente conduzidos à distância, em plataformas digitais. Agora, se somássemos a dificuldade de fiscalização por parte dos mais diversos órgãos de controle, mais um projeto de lei como o PL 3081/2022, qual o futuro que podemos esperar para a Engenharia brasileira?

"O debate que precisamos ter é sobre a modernização e atualização das leis que regem nossas profissões. É fato que a Lei 5.194/1966 está ultrapassada. Vemos isso por um simples ponto da lei que diz que o recurso destinado à capacitação profissional deve ser originário da captação por multas. As multas são apenas 1% do recolhimento do Sistema CONFEA/CREA. Ou seja, poderíamos fazer muito mais pelos profissionais ao mudar simplesmente este trecho da legislação. Este é apenas um exemplo."

"Em quase 60 anos de existência da lei é possível imaginar quanta coisa mudou para que haja essa necessidade de atualização. As Engenharias e toda a área tecnológica sempre foram essenciais para o desenvolvimento da sociedade por sua capacidade analítica de resolver problemas, e este é mais um dos que precisamos solucionar."


Imagens: Todos os Créditos reservados aos respectivos proprietários (sem direitos autorais pretendidos). Caso eventualmente você se considere titular de direitos sobre algumas das imagens em questão, por favor entre em contato com contato@engenharia360.com para que possa ser atribuído o respectivo crédito ou providenciada a sua remoção, conforme o caso.

Comentários

Engenharia 360

Eduardo Mikail

Somos uma equipe de apaixonados por inovação, liderada pelo engenheiro Eduardo Mikail, e com “DNA” na Engenharia. Nosso objetivo é mostrar ao mundo a presença e beleza das engenharias em nossas vidas e toda transformação que podem promover na sociedade.

LEIA O PRÓXIMO ARTIGO

Continue lendo