Este é um daqueles assuntos que "precisamos falar sobre". Embora o número de mulheres ingressando na Engenharia tenha crescido nos últimos anos, a evasão dos cursos e o abandono da carreira ainda é elevado. Isso nos leva a questionar: o que leva uma mulher a desistir da carreira na Engenharia?
+ Mulheres na Engenharia
Há muitos anos, a Engenharia era vista como um campo masculino. Felizmente, a essa visão mudou muito nos últimos anos. Isso aconteceu graças a muitas guerreiras que enfrentaram várias dificuldades para conquistar seu espaço na Engenharia.
Obviamente, o primeiro fator que leva uma mulher a desistir da carreira na Engenharia é o assédio (de qualquer tipo). É desconfortável para uma mulher estar em uma posição na qual ela pode ser desvalorizada, menosprezada ou até mesmo chantageada simplesmente por ser mulher. A sensação piora quando vem acompanhada da desvalorização do trabalho que é feito ou até mesmo da supervalorização e do espanto. Um exemplo: “nossa, você é muito boa com tal coisa para ser mulher” ou “você trabalha como um homem”. Frustrante!
As mulheres não precisam ser comparadas aos homens para serem julgadas pela qualidade do seu trabalho. É preciso partir do pressuposto que mulheres e homens são igualmente capazes e não de uma visão que, claramente, coloca o homem como referencial padrão e a mulher como alguém tentando chegar lá. Ou seja, as mulheres não têm que ficar provando o tempo todo que são capazes de fazer determinada tarefa. É preciso que elas sejam vistas como capazes.
Muitas vezes, as mulheres recebem o título de nervosas, estressadas ou emocionalmente instáveis e são desvalorizadas por isso. No entanto, a maior parte dessas reações pode ocorrer devido ao estresse constante de estar em um ambiente hostil, no qual nunca está confortável e precisa mostrar o tempo todo que merece o lugar que conquistou.
+ Não existe coisa de menino e coisa de menino, é tudo "coisa de gente"
Um segundo argumento que deve ser mencionado é que não deve haver separação de gênero entre as tarefas. Isso é: não tem essa de coisa de menino e coisa de menina. Uma mulher e um homem podem realizar as mesmas tarefas. Afinal, a Engenharia não envolve só questões físicas (do ponto de vista da diferença biológica entre mulheres e homens), mas é um conjunto de capacidades físicas e mentais.
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Um exemplo é que não adianta nada conseguir só conseguir levantar muito peso se você não consegue pensar em uma forma mais inteligente e otimizada de fazê-lo. Levantar algo pesado não é Engenharia, mas criar uma forma mais fácil de levantar muito peso pode sim envolver Engenharia.
Outro problema é o fato de que as mulheres são normalmente excluídas das tarefas mais práticas ou mais pesadas e são designadas para as voltadas para a gestão e organização. Isso significa tirar toda a diversão da parte prática e atribuir tarefas que podem ser entediantes para uma engenheira que quer colocar todos os seus conhecimentos em ação. É difícil lidar com a sensação de desvalorização quando você quer colocar a mão na massa de verdade e te colocam para separar ou organizar papel.
Porém, é difícil pensar assim quando crescemos em uma sociedade moldada, na qual as brincadeiras de meninos e meninas são diferenciadas. Para uma menina que cresce ouvindo que “desmontar e consertar coisas é para meninos” ou que “mulheres devem cuidar do lar”, é realmente difícil desconstruir essa visão.
+ Maternidade não é justificativa
Outro fator usado como argumento para a evasão das mulheres da carreira da Engenharia é o ligado à maternidade. Porém, se pararmos para pensar, tal fator poderia ser considerado relevante há alguns anos, mas não agora. Atualmente, devido aos direitos garantidos na maternidade, é muito mais difícil encontrar uma mulher que abandonou a carreira (em qualquer área) para cuidar exclusivamente do lar e dos filhos. Então, a maternidade não tem muita interferência nesta discussão.
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+ O que dizem as pesquisas sobre mulheres e a carreira na engenharia
Um artigo científico publicado em 2017 mostra que ainda há grandes lacunas na compreensão das razões pelas quais as mulheres deixam a Engenharia. Entrevistando várias mulheres, os autores descobriram três grandes motivos: remuneração baixa/injusta, más condições de trabalho e ambiente de trabalho hostil; insatisfação com o uso de suas habilidades em matemática e ciências e, por último, falta de reconhecimento e de oportunidades no trabalho.
Em 2016, algumas estatísticas dos Estados Unidos indicavam que apenas 13% da força de trabalho no país era composta por mulheres. Ainda, 20% dos graduados em engenharia são mulheres, mas 40% abandonam a carreira ou nem mesmo chegam a exercer a profissão. Isso sem falar na quantidade de mulheres que abandonam a própria graduação. Afinal, situações constrangedoras na sala de aula - composta por uma maioria de homens - são frustrantes.
É inacreditável ver também professores que incentivam a pressão exercida sobre as mulheres. Infelizmente, há muitos que não aceitam a presença de mulheres nas turmas de Engenharia (o que é um absurdo enorme). Durante a graduação, que visa formar profissionais, é preciso ressaltar que o reconhecimento deve ser feito de forma independente do gênero.
Uma mulher não quer (e não precisa) de um homem abrindo portas para ela (no sentido literal e figurado). Ela é muito capaz de abrir suas próprias portas. No entanto, para isso, é preciso que a primeira delas, chamada igualdade, esteja aberta. É preciso mudar essa cultura na qual as mulheres não são levadas a sério e preciso repensar toda a nossa postura como sociedade para reduzir a evasão das mulheres da carreira.
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Larissa Fereguetti
Cientista e Engenheira de Saúde Pública, com mestrado, também doutorado em Modelagem Matemática e Computacional; com conhecimento em Sistemas Complexos, Redes e Epidemiologia; fascinada por tecnologia.