Neste texto do Engenharia 360, vamos focar no papel do engenheiro químico neste novo cenário. E para falar sobre isso, foi convidado o colaborador do Engenharia 360, Diego Rafael Santos, com sete anos atuando na indústria. Confira!
Lembrando que a indústria, de modo geral, está evoluindo e crescendo de forma bastante expressiva nos últimos anos. A própria pandemia tem impulsionado grandes transformações. E algo que não podemos negar é a importância da Engenharia Brasileira se adequar, cada vez mais, ao modelo de Indústria 4.0.
1) Na sua opinião, qual é a importância da atuação dos engenheiros na atualidade, pensando na resolução de todos os problemas que enfrentamos e na busca por soluções eficazes, além de mais econômicas e eco-friendlies possível?
"Nos países emergentes, como o Brasil, a engenharia se mostra indispensável para a ampliação da infraestrutura, para a melhoria na qualidade de serviços prestados à sociedade e para a resolução de problemas de caráter econômico, ambiental e social. Devido a sua formação, o profissional de Engenharia desenvolve alta capacidade analítica e habilidades para integrar conhecimentos técnico-científicos, no sentido da inovação e da solução de problemas tecnológicos. Esses fatores evidenciam que a atuação do engenheiro é fundamental para o desenvolvimento da sociedade. Contudo, é importante ressaltar que estes profissionais necessitam estar sempre na vanguarda do conhecimento tecnológico e desenvolver cada vez mais habilidades comportamentais (soft skills), uma vez que a tecnologia está impactando o mundo de forma profunda, mudando a dinâmica da sociedade."
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2) Vamos ao tema principal da nossa conversa: explique para os nossos leitores, em poucas palavras, a tradução do conceito 'Indústria 4.0' ou 'Quarta Revolução Industrial'!
"De forma simples, todo período em que a tecnologia provoca mudanças profundas na sociedade, alterando nossa forma de se relacionar, locomover, trabalhar e consumir, é definido como uma Revolução Industrial.",
"Nosso mundo está passando por um momento como este pela quarta vez, sendo as tecnologias digitais a principal força motriz. Com base nisso, o termo 'Indústria 4.0' representa a 'Quarta Revolução Industrial'.,
"Enquanto as outras três transformações foram focadas na automação de máquinas e processos, a Indústria 4.0 centra-se na digitalização de ponta a ponta de todos os ativos físicos e a integração de um ecossistema digital."
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3) Para você, quais as consequências da digitalização na Indústria Química e no estudante e profissional de Engenharia Química?
"Na indústria química, com a digitalização dos ativos e a implantação de ecossistemas digitais, tenho observado grande aumento de produtividade, eficiência e, até mesmo, a transformação de modelos de negócio. Veja o caso de empresas como o da Raízen e Ambev, que desenvolveram plataformas digitais para o cliente final, sendo elas o Shell Box e o Zé Delivery, respectivamente.",
"A digitalização está mudando a indústria, mas, no caso do Brasil, o processo de transformação ainda precisa amadurecer. Já em relação ao estudante e ao profissional de Engenharia, além das habilidades digitais, a transformação tecnológica está exigindo cada vez mais o desenvolvimento de habilidades comportamentais, como empatia, comunicação, pensamento crítico, inteligência emocional, aprender a aprender, multidisciplinaridade, liderança e criatividade."
4) De acordo com o seu conhecimento, quais as melhores oportunidades de atuação que você acha que o engenheiro químico irá encontrar nesta nova fase da indústria?
"Vejo que essa nova fase aumenta a gama de possibilidades. Com as tecnologias digitais, o engenheiro químico tem muito mais ferramentas e oportunidades para desenvolver e otimizar processos. Agora, podemos aplicar, de forma mais simples e viável, tecnologias de controle avançado, simulação de processos, inteligência artificial, realidade aumentada, e muito mais. E como o Brasil é um país em desenvolvimento e carente de profissionais qualificados, as novas necessidades da indústria trazem boas oportunidades. Contudo, é importante ressaltar que a demanda de engenheiros anda lado a lado com o PIB e a situação econômica do país. Em linhas gerais, se a economia cresce, a demanda aumenta; se a economia retrai, a demanda anda na mesma direção. Levando isso em consideração, também é preciso estar atento ao contexto econômico para entender e selecionar as melhores oportunidades."
5) Como tudo isso que envolve a 'Indústria 4.0' (como Internet das Coisas, Robôs Automatizados, Computação em Nuvem e mais) pode melhorar ou já está melhorando os processos através da integração de toda a cadeia produtiva industrial, desde o fornecimento de insumos para a manufatura até a distribuição do produto final? Por exemplo, comente sobre os ganhos e benefícios operacionais da adoção do modelo 4.0!
"As tecnologias da Indústria 4.0 trazem o conceito de Planta Auto-Otimizada. Trata-se de uma operação de auto-aprendizagem, auto-ajustável e auto-sustentável. Com isso, é possível analisar dados em tempo real e fazer ajustes mais inteligentes durante a operação, reagindo de forma automática nas condições para cumprir as metas. Além disso, é possível detectar problemas com antecedência, para maximizar o tempo de atividade e melhorar a longevidade dos ativos. Como resultado, é extraído mais valor dos equipamentos de produção, tornando-os mais seguros, mais ecológicos, por mais tempo e mais rápido. A maior velocidade em análise de dados leva a uma melhor tomada de decisão e colaboração, aumentando a produtividade, rendimento e flexibilidade operacional.
6) Conte para nós quais foram as maiores transformações de sistemas de controle, supervisórios e mais que você presenciou em seu dia-a-dia de trabalho nos últimos anos.
"Os sistemas industriais avançaram muito nos últimos anos, tanto em controle de processos, quanto em histórico e análise de dados. Hoje existe o Sistema Digital de Controle Distribuído (SDCD), historiadores com ferramentas avançadas de análise de dados e, até mesmo, controle avançado aprimorado com ferramentas de Inteligência Artificial.",
"Quando iniciei minha carreira na indústria, há sete anos, grande parte dos processos eram controlados em campo e eu analisava dados de forma manual em planilhas eletrônicas. Hoje, atuo em processos operados via sistemas de controle e grande parte dos dados já são coletados e analisados automaticamente através de algoritmos. Além disso, tenho o controle de algumas operações unitárias sendo realizadas via aprendizado de máquina.",
"Contudo, é importante ressaltar que esta não é a realidade da maioria das indústrias no Brasil. Muitas empresas ainda têm uma base antiga instalada, com baixa velocidade e processadores inferiores, principalmente no que diz respeito às redes industriais. Além disso, outro desafio da indústria brasileira é desenvolver a capacidade de avaliar os investimentos em SDCD a longo prazo. Em uma visão imediatista, o custo do investimento acaba sendo considerado alto. Entretanto, a modernização é fundamental, especialmente em um momento que exige cada vez mais produtividade, eficiência operacional e adoção de tecnologia."
7) Você acredita que os conhecimentos adquiridos pelos estudantes de Engenharia Química durante a sua formação (pensando principalmente nas instituições brasileiras) é o suficiente para entender e responder o modelo de 'Indústria 4,0'?
"De forma geral, as universidades brasileiras oferecem uma boa bagagem técnico-teórica dos fundamentos envolvidos nas engenharias. Contudo, o sistema de ensino é falho quando falamos de tecnologias como Inteligência Artificial, controle avançado e análise de dados. Além disso, as universidades não fomentam o desenvolvimento de habilidades comportamentais, cada vez mais necessárias hoje em dia.",
"Nesse contexto, vejo que é fundamental o estudante buscar conhecimento e experiências além das portas da academia. Estar pronto para o futuro não significa somente adquirir conhecimento técnico, mas desenvolver habilidades que podem ser aplicadas a qualquer trabalho. Habilidades estas inerentes aos humanos, pois são elas que nos diferenciam dos robôs."
8) Dizem que é na subárea da Engenharia Química definida como 'Engenharia de Processos' em que se dará a maior parte das transformações na quarta onda da Revolução Industrial. Você concorda com isso? Se sim, pode nos citar um exemplo?
"O engenheiro de processos é o profissional da Engenharia Química que trabalha na operação de uma planta. Ele acompanha o processo no dia-a-dia e desenvolve soluções para otimizar os ativos, aumentando a eficiência e reduzindo o consumo de matéria-prima, por exemplo. Para atingir os resultados desejados, o engenheiro de processos pode utilizar tecnologias de automação, controle avançado, gêmeos digitais, Inteligência Artificial, Machine Learning e muito mais.",
"Então, levando isso em consideração, podemos, sim, afirmar que a Engenharia de Processos é a área da Engenharia Química em que ocorre a maior parte das transformações da Quarta Revolução Industrial."
9) Como você enxerga o nível de qualidade de mão de obra disponível hoje no mercado das engenharias? Será que os brasileiros estão se preparando bem para atender à demanda das indústrias e os futuros empregos que devem surgir dessa nova revolução?
"Na minha experiência, a mão-de-obra disponível no mercado de Engenharia é de boa qualidade. Como disse anteriormente, as universidades brasileiras oferecem uma boa bagagem técnico-teórica dos fundamentos envolvidos nas engenharias. Contudo, vejo um déficit de conhecimento em tecnologias digitais, como Data Science e Programação, por exemplo.",
"Entretanto, é importante destacar que estas são habilidades que qualquer pessoa pode 'correr atrás' e aprender. Hoje, todo o conhecimento desenvolvido pela sociedade está literalmente na palma das nossas mãos, sendo muito mais fácil e barato aprender e desenvolver novas habilidades. Nesse quesito, vejo que o brasileiro precisa aproveitar mais e melhor as oportunidades de aprendizado que a Internet está trazendo.
10) Imagine um profissional já graduado há bastante tempo em Engenharia Química, mas que quer se atualizar para atender melhor a indústria. Que tipo de curso complementar você recomendaria que ele fizesse, pensando em obter mais conhecimento sobre esta 'Quarta Revolução Industrial'?
"Primeiramente, eu recomendaria esse profissional ler muito sobre transformação digital, atualidades e como a tecnologia está impactando a sociedade. O acesso a essas informações está facilmente disponível na Internet. Além disso, ele poderia fazer cursos relacionados ao tema em diversas plataformas digitais, como StarteSe, Udemy, Escola Conquer e Data Scinece Academy, por exemplo; essas empresas oferecem cursos técnicos e estratégicos relacionados à gestão."
11) Você indicaria também para os nossos leitores algum título de livro ou outra bibliografia complementar sobre o assunto?
"Sugiro a leitura do livro 'Automação e Sociedade: Quarta Revolução Industrial, um olhar para o Brasil'. A obra apresenta e discute a Quarta Revolução Industrial, trazendo profundas reflexões sobre o tema e apresenta diversas oportunidades a serem exploradas pelo nosso país. Ao mesmo tempo, faz alerta sobre os riscos de não se participar ativamente do processo de mudança desencadeado por essa revolução. O livro cria ainda uma base sólida para que profissionais possam compreender as correlações entre diferentes inovações tecnológicas, processos de negócios e modelos mentais - cada vez mais presentes na sociedade e nas organizações."
12) Por último, gostaria de passar alguma mensagem final para os leitores e seguidores do Engenharia 360?
"Eu acredito que nossa carreira somos nós quem fazemos! Então, não fique esperando algo acontecer. Corra atrás dos seus objetivos. Estude novas tecnologias, culturas e finanças; desenvolva novas habilidades; conheça pessoas e aprenda o máximo que você puder.",
"O conhecimento é uma das poucas coisas que ninguém pode tirar de você e é uma das principais forças que pode mudar a vida das pessoas! Cuide com carinho da sua carreira e lute pelos seus sonhos."
Nota: Na data de atualização desse texto, em agosto de 2023, um grande incêndio atingiu uma indústria química na Zona Norte de São Paulo. Equipes de bombeiros foram ao local para controlar o fogo, que foi confinado. Não houve feridos e não houve risco de propagação para a comunidade próxima. Mas foi preciso trabalhar para combater as chamas e proteger a população. A Cetesb foi acionada, e seus técnicos agiram após o término do combate ao incêndio. Fica aqui a reflexão sobre os riscos envolvidos para quem trabalha na indústria química.
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