Engenharia 360

Entenda o plano de mineração para obter combustível de foguetes na Lua

Engenharia 360
por Kamila Jessie
| 26/05/2020 | Atualizado em 30/08/2023 5 min
Imagem de Freepik

Entenda o plano de mineração para obter combustível de foguetes na Lua

por Kamila Jessie | 26/05/2020 | Atualizado em 30/08/2023
Imagem de Freepik
Engenharia 360

Nota: Na atualização deste texto, em 30 de agosto de 2023, a Sonda lunar indiana Chandrayaan-3 encontrou oxigênio, enxofre e outros elementos no solo da Lua após histórico pouso no polo sul lunar.

A saber, essa missão visa também estudar a água congelada, crucial para futuras bases astronautas. A Índia foi o primeiro país a pousar com sucesso no polo sul da Lua; a área é desafiadora e até então inexplorada, marcando um feito significativo. A região é traiçoeira com crateras e temperaturas extremamente baixas. Agora, a exploração lunar visa aproveitar descobertas de água feitas em missão anterior, em 2008. A sonda continuará operando por mais uma semana.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO


A busca por recursos tem feito as pessoas olharem para o espaço. Pensando nisso, a Lua pode ser uma alternativa, sendo que um dos itens de interesse para mineração lunar é animador especialmente para profissionais do setor espacial. Acredite ou não: é a água. O problema? Há desafios de extração e purificação.

Existe água na Lua?

Em 2018, a NASA havia confirmado que existe sim, a partir de evidências da missão Moon Mineralogy Mapper (M3), que havia sido lançada dez anos antes, em 2008, com o intuito de confirmar a existência de gelo na Lua. O instrumento carrega consigo um espectrômetro capaz de captar as propriedades refletivas da água congelada e medir diretamente a maneira como suas moléculas absorvem a luz infravermelha, permitindo a diferenciação entre água líquida, vapor de água e gelo sólido.

Com a missão M3, ficou claro que há evidências definitivas de gelo na superfície lunar, concentrado nas partes mais escuras e frias de seus polos. Esses depósitos de gelo são distribuídos de maneira irregular e podem ser bem antigos. No polo sul, a maior parte do gelo está concentrada nas crateras lunares, enquanto o gelo do polo norte é mais amplo, mas distribuído de forma esparsa.

Resultados do M3 sobre a distribuição do gelo na Lua. Imagem: NASA.
Resultados do M3 sobre a distribuição do gelo na Lua. Imagem: NASA.

Qual o intuito de usar água da Lua?

Pense nos constituintes da molécula de água: você pode dividi-la em hidrogênio e oxigênio. Em seguida, é possível liquefazer esses dois elementos, gerando combustível de foguete. Se você fosse capaz de reabastecer na lua, não precisaria mais levar todo o seu propulsor na decolagem, tornando sua espaçonave significativamente mais leve e barata de lançar. Considerando isso, a Lua poderia se tornar uma espécie de posto de gasolina interplanetário para viagens a Marte, por exemplo, facilitando planos ambiciosos como os de Elon Musk.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

Tem gente trabalhando em mineração na Lua?

Existe trabalho em andamento pensando na tal água lunar. A Agência Espacial Europeia, China, Índia e EUA têm projetos relacionados a esse tópico. Recentemente, a NASA anunciou os Acordos da Artemis - uma estrutura legal proposta para a mineração na Lua, nomeada após o programa Artemis da NASA de devolver astronautas à superfície lunar em 2024.

Contudo, perguntas ainda permanecem: como é que, de fato, conseguiríamos acessar a água da lua. Existem muitos obstáculos, incluindo temperaturas baixas demais, radiação e o próprio solo lunar. Sem mencionar que os astronautas teriam de manter uma base por mais tempo na Lua. Esse é um plano ambicioso da Artemis, mas será que vai vingar?

Como extrair o gelo lunar?

Agora vêm as ideias mirabolantes: mesmo considerando os obstáculos mais óbvios para mineração na Lua, ainda há outras dificuldades. Uma delas é relacionada ao fato de que a água não está tão acessível na superfície da Lua. A tal água lunar está na forma de minúsculos grãos de gelo misturados no solo, localizados principalmente nas regiões permanentemente sombreadas, dentro de crateras próximas aos polos. Lá, temperaturas de 40 K (-233,15 °C) mantêm o gelo da água estável.

Conceito de sistema para extração de gelo lunar. Imagem: George Sowers.
Conceito de sistema para extração de gelo lunar. Imagem: George Sowers.

Uma das alternativas foi levantada pelo engenheiro de arquiteturas espaciais da Escola de Minas do Colorado, George Sowers, junto uma equipe de mais de uma dúzia de colaboradores. O trabalho publicado na revista Reach, no ano passado, descreve grandes torres com espelhos côncavos no topo, que seriam erguidas e instaladas nas bordas da cratera lunar, visando refletir a luz do sol em regiões permanentemente sombreadas. Essa energia aqueceria o solo lunar até 220 K (-53,15 °C), o suficiente para fazer o gelo da água se transformar em vapor.

PUBLICIDADE

CONTINUE LENDO ABAIXO

Esse vapor d’água seria capturado em uma tenda (em um arranjo parecido com o de alguns projetos de retirada de água do ar em regiões desérticas) e ressublimado. A ideia de transformar em gelo outra vez é para facilitar o transporte para a instalação de purificação e quebra. Lá, a água seria dividida em hidrogênio e oxigênio por eletrólise e, finalmente, liquefeita para que os constituintes pudessem ser usados ​​como propulsores de foguetes.

Detalhes do conceito de sistema para extração de gelo lunar. Imagem: George Sowers.
Detalhes do conceito de sistema para extração de gelo lunar. Imagem: George Sowers.

Aproveitar energia solar é consenso entre cientistas envolvidos nessas questões espaciais. Uma outra alternativa foi apresentada pela Trans Astronautica Corporation, sediada na Califórnia. Eles esboçaram planos para torres altas com painéis solares para aproveitar a energia e levá-la até as crateras lunares. De lá, usar radiofrequência, micro-ondas e radiação infravermelha para sublimar o gelo da água.

O desafio da purificação:

Outra questão é que a água lunar não está livre de contaminantes. Os grãos são fortemente misturados com outros elementos. Isso foi confirmado em 2009, por meio da missão LCROSS da NASA, que disparou um foguete contra a lua para lançar plumas de rocha lunar no ar. Uma análise deste material transportado pelo ar descobriu que era apenas 5,6% de água em peso.

Screen de resultados do ICROSS para medir a pureza da água na lua. Imagem: NASA.
Screen de resultados do ICROSS. Imagem: NASA.

Esses dados, mesmo que obtidos há mais de dez anos, ainda são a análise direta mais recente do conteúdo de água do solo lunar que temos. Ainda assim, sugerem que mesmo que o gelo possa ser separado do solo lunar, ele ainda é muito impuro e exigiria um tratamento robusto para livrar-se de contaminantes que arruinariam qualquer combustível feito a partir dele. Pensem: se já temos desafios para o tratamento de água para consumo na Terra, imaginem a dificuldade de conseguir água ultrapura para ser quebrada em combustível de foguete na lua.

Você acha que um pitstop na Lua é promissor para viagens espaciais? Comente!

Veja Também:


Fontes: MIT Tech Review, NASA, NASA – JPL, NASA – JPL.

Imagens: Todos os Créditos reservados aos respectivos proprietários (sem direitos autorais pretendidos). Caso eventualmente você se considere titular de direitos sobre algumas das imagens em questão, por favor entre em contato com contato@engenharia360.com para que possa ser atribuído o respectivo crédito ou providenciada a sua remoção, conforme o caso.

Comentários

Engenharia 360

Kamila Jessie

Doutora em Hidráulica e Saneamento pela Universidade de São Paulo (EESC/USP) e Mestre em Ciências pela mesma instituição; é formada em Engenharia Ambiental e Sanitária pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG) com período sanduíche na University of Ottawa, no Canadá; possui experiência em tratamentos físico-químicos de água e efluentes; atualmente, integra o Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF) do Instituto de Física de São Carlos (USP), onde realiza estágio pós-doutoral no Biophotonics Lab.

LEIA O PRÓXIMO ARTIGO

Continue lendo