A NASA conseguiu analisar a perda de gelo durante o período de 16 anos na Groelândia e na Antártica. As medições foram realizadas com base em alterações de elevação detectadas pelo ICESat e ICESat-2, altímetros a laser situados no espaço. Os resultados fornecem insights sobre as mudanças no aspecto das calotas polares e trazem mais evidências para que a gente se prepare para os efeitos das mudanças climáticas.
Monitoramento via satélite da elevação do gelo
As descobertas vêm de uma belezinha da instrumentação, o satélite ICESat-2, da NASA, lançado em 2018 para fazer medições detalhadas de elevação global, incluindo a de regiões congeladas da Terra. Ao comparar os dados recentes com as medições realizadas pelo ICESat original de 2003 a 2009, os pesquisadores geraram um retrato abrangente das complexidades das mudanças e informações sobre o futuro da Groenlândia e da Antártica.
Caso você tenha ficado curioso sobre como funciona o instrumento, a gente explica: o ICESat-2 é um altímetro a laser, que envia 10.000 pulsos de luz por segundo para a superfície da Terra e calcula quanto tempo leva para que esses pulsos retornem. A precisão é de até um bilionésimo de segundo. É essa precisão que permite entender evoluções pequenas durante longos períodos, tais como taxas de centímetro por ano.
Então começa a parte de estudo e interpretação dessa quantidade enorme de dados gerados. Os pesquisadores sobrepuseram as medições do satélite original com o ICESat-2 a partir de 2019 e coletaram dados de dezenas de milhões de pontos nos quais houve o cruzamento entre os conjuntos de dados. Isso permitiu verificar a mudança de elevação.
O problema é que a gente não mede necessariamente o gelo em termos de espessura, então a equipe desenvolveu um modelo para converter a relação área x altitude em volume e, em seguida, mudança de massa, considerando as densidades. Isso permitiu ter uma noção da perda de gelo em termos de massa total.
O que está acontecendo com o gelo?
As observações demonstraram que pequenos ganhos de gelo na Antártica Oriental são diminuídos por perdas massivas na Antártica Ocidental. Os cientistas descobriram que a perda líquida de gelo da Antártica, juntamente com o encolhimento da camada de gelo da Groenlândia, foi responsável por um aumento do nível do mar de aproximadamente 1,4 cm entre 2003 e 2019 - pouco menos de um terço da quantidade total de aumento do nível do mar observado nos oceanos do mundo.
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A importância de converter esses dados para massa é justamente porque falar em pouco mais de um centímetro não parece muita coisa. O estudo verificou que a camada de gelo da Groenlândia perdeu uma média de 200 gigatoneladas de gelo por ano, e a camada de gelo da Antártica perdeu uma média de 118 gigatoneladas de gelo por ano. Mas como a gente não consegue enxergar números assim, a NASA deu exemplos: uma gigatonelada de gelo é suficiente para encher 400.000 piscinas olímpicas ou cobrir o Central Park de Nova York em gelo com mais de 300 metros de espessura.
As mudanças climáticas e nossa infraestrutura
Estudos como o monitoramento da espessura do gelo nas camadas polares podem parecer muito distantes das aplicações. Entretanto, não se enganem: essa questão é fundamental para a elaboração de modelos preditivos que permitam que a gente saiba o que fazer na situação de elevação do nível do mar para daqui a 30 ou 50 anos – o que levanta a pauta do tempo de retorno das nossas obras, principalmente costeiras.
Os Estados Unidos já abordaram esse tema de investimento em infraestrutura, considerando a questão climática. O trabalho desenvolvido pela NASA é mais um alerta, tendo indicado que, na Antártica, por exemplo, a camada de gelo está ficando mais espessa em partes do interior do continente como resultado do aumento da neve, mas a perda de gelo nas margens do continente, especialmente na Antártica Ocidental e na Península Antártica, supera em muito qualquer ganho no interior. Nesses lugares, a perda se deve ao aquecimento do oceano.
Na Groenlândia, houve uma quantidade significativa de afinamento das geleiras costeiras. Algumas geleiras perderam de 4 a 6 m de altitude por ano; bacias glaciais perderam entre 16 22 gigatoneladas por ano. As temperaturas mais quentes do verão derreteram o gelo da superfície das geleiras e das camadas de gelo e, em algumas bacias, a água mais quente do oceano leva o gelo em suas frentes.
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O vídeo abaixo, em inglês, apresenta visualmente os resultados do estudo.
O que a gente não vê, tem satélite medindo. O que você acha que a gente deve fazer para conter as elevações no nível do mar?
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Kamila Jessie
Doutora em Hidráulica e Saneamento pela Universidade de São Paulo (EESC/USP) e Mestre em Ciências pela mesma instituição; é formada em Engenharia Ambiental e Sanitária pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG) com período sanduíche na University of Ottawa, no Canadá; possui experiência em tratamentos físico-químicos de água e efluentes; atualmente, integra o Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF) do Instituto de Física de São Carlos (USP), onde realiza estágio pós-doutoral no Biophotonics Lab.