O microgerenciamento é um modelo de gestão pautado pela incursão do gestor nas atividades operacionais dos processos produtivos, performance comum de engenheiros quando ocupam cargos de gestão. É um estilo de gerenciar que, como todos os outros, possui benefícios e malefícios. É claro que os gerentes devem se envolver sim com os colaboradores, mas eles não podem esquecer de que o seu trabalho é orientar a equipe, supervisionar o trabalho e cobrar resultados.
Ocorre que muitas vezes o gerente ocupa-se de auxiliar os colaboradores na execução de tarefas, pelas necessidades da empresa ou pela configuração do quadro hierárquico – ou também, não se pode descartar – pela tendência ao comportamento microgerencial. O microgerente geralmente está mais atento àquilo que se passa no setor, uma vez que acompanha cada passo de perto.
Por outro lado, isso pode afetar negativamente a qualidade do trabalho, visto que super administrar o trabalho de outrem – ou fazer por ele – pode desmotivar ao invés de motivar. Pode comprometer também o nível de gerenciamento, pois o microgerente, se não se atém ao que lhe realmente compete, perde tempo com coisas mínimas quando poderia estar elaborando estratégias e estabelecendo metas produtivas com maior dedicação. Isso quando o microgerente não se põe a criticar, repetidamente, tudo o que vê (porque faz questão de ver tudo, sem dar tempo de o colaborador tentar ser mais elaborado).
Histórias de um Microgerente
Há um caso famoso de microgerente – o falecido CEO da Apple, Steve Jobs, como mostra Leander Kahney no livro “A cabeça de Steve Jobs”. Steve foi o típico microgerente. E ele não era nem gerente, ele era o CEO (Chief Executive Officer, a nova nomenclatura para o maior cargo executivo da maioria das empresas). Ele se preocupava com os mínimos detalhes (dá para perceber porque os “iProducts” são verdadeiras obras de arte). Segundo o autor do livro, Steve dava palpite aos designers (design para ele é função), além de dar uma “stevada” nos engenheiros, acompanhando a fabricação e ainda levando os produtos para testar em casa.
Já trabalhei com um microgerente. Felizmente, suas qualidades compensavam os problemas do microgerenciamento. Vou chamá-lo de João. Quando fui apresentado-lhe pela primeira vez, não associei a sua postura a um cargo de poder tão relevante (naquela empresa, a gerência fica logo abaixo da diretoria). João mantinha certo distanciamento hierárquico, é verdade, mas agia com naturalidade, sem cerimônias. Em outras palavras, não era um homem de grandes formalidades.
Mestrado
Era formado em duas engenharias, possuía um mestrado em engenharia e estava terminando um MBA. Também havia sido professor universitário – e tinha didática em tudo. Demonstrava deter – e, de fato, detinha – muito conhecimento e experiência profissional. Depois, conversando com o meu superior imediato, que já havia trabalhado com o ele em outra empresa, soube que a empresa não tinha apenas um setor atípico (as empresas desse ramo vinham então terceirizando essa área), mas um setor atípico liderado por um gerente atípico.
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Fazia calor no dia em que o conheci. Era a segunda vez que visitava os escritórios da companhia. Havia sido chamado para o exame médico e os trâmites necessários para a contratação. Na hora do almoço, forneceram-me um tíquete-alimentação e me adentraram no refeitório corporativo. Sentei-me à mesa com o meu superior imediato e com o gerente, João. Este me perguntou sobre o que eu pretendia para a minha vida. Como na entrevista de emprego, eu respondi dizendo que pretendia trabalhar, mas que continuaria estudando, embora soubesse que é positivo que os chefes sintam que os funcionários colocam o trabalho em primeiro lugar em suas vidas, mesmo isso nem sempre sendo verdadeiro. Para minha surpresa, João me disse, tranquilamente:
Não deixe que o trabalho atrapalhe os seus estudos.
Novas experiências
Algumas experiências que me foram relatadas podem ilustrar perfeitamente o que pretendo dizer. Certa vez João avistou um funcionário de baixo escalão se alimentando fartamente em horário indevido. Para engano do próprio funcionário e de quem estava nas adjacências, nenhuma advertência foi feita. João, num gesto inesperado, pediu um pouco para que provasse. O despojo e a simplicidade do gerente, deliberados ou não, alcançaram a simpatia dos colaboradores.
O lema de João era “honestidade e boa vontade”. Para ele, um funcionário que errasse merecia perdão se a intenção era acertar. Infere-se daí que ele valorizava a cultura do aprendizado nas relações trabalhistas. Meu superior imediato costumava compará-lo a Simeão, o alto-executivo que se tornou monge e passou a dar lições de liderança, personagem do livro “O Monge e o Executivo”, de James C. Hunter. “João é um gerente que você não pode tomar como padrão”, dizia.
Nesse sentido, eu tive a sorte de ter um gerente como ele, que apesar de tudo sabia ser um líder. Mas as coisas nem sempre são assim.
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Acredito que a melhor forma de gerenciar é dar condições para as pessoas darem o melhor de si para atingir os objetivos que propostos. É não negar ao trabalhador que, de certa forma (e isso pode soar um pouco egoísta) ele é sim um recurso, um capital a ser explorado. Mas não deixar de reconhecer a sua importância e as suas necessidades enquanto ser humano, o que também significa dar tempo e espaço para que ele se sinta capaz de executar e execute o trabalho de forma bem feita, sentindo-se feliz por isso. Faz bem enfiar o dedo no bolo às vezes, mas não o tempo todo, e muito menos sair por aí lambuzando todo mundo.
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Eduardo Mikail
Somos uma equipe de apaixonados por inovação, liderada pelo engenheiro Eduardo Mikail, e com “DNA” na Engenharia. Nosso objetivo é mostrar ao mundo a presença e beleza das engenharias em nossas vidas e toda transformação que podem promover na sociedade.