Engenharia 360

Como Funciona e Qual a Importância da Estrutura do Muro da Mauá em Porto Alegre?

Engenharia 360
por Simone Tagliani
| 18/05/2024 6 min
Imagem reproduzida de O Globo

Como Funciona e Qual a Importância da Estrutura do Muro da Mauá em Porto Alegre?

por Simone Tagliani | 18/05/2024
Imagem reproduzida de O Globo
Engenharia 360

Deixa eu contar um pouco a você sobre a minha cidade, Porto Alegre. Ela foi manchete nos principais jornais do mundo neste abril e maio de 2024. Isto porque a região, assim como quase 400 outros municípios do estado, sofreram com as chuvas, as enchentes, deslizamentos e mais. Logo, o nosso estuário Guaíba, que banha a cidade, recebeu um volume absurdo de água. E o famoso Muro da Mauá ou do Cais Mauá foi testado como nunca.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem de Luciano Lanes, PMPA, reproduzido de CNN Brasil

Cresci ouvindo as histórias dos mais velhos sobre uma enchente de 1941 que teria enchido o centro da cidade, criando um caos na vida de todos. Mas também me tornei adulta ouvindo, inclusive na faculdade de Arquitetura, sobre um muro construído para proteger a cidade. E, assim como eu, muitos pensavam que estávamos protegidos. Porém, os fatos recentes provam que o clima da Terra mudou e, para tal, não estamos salvos. Confira mais detalhes no texto a seguir, do Engenharia 360!

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A Grande Enchente de 1941 e a construção do Mura da Mauá

A Grande Enchente de 1941 é uma lembrança marcante na história de Porto Alegre. Ela ocorreu naquele ano justamente nos mesmos meses, abril e maio. As águas do Guaíba submergiram vastas áreas do bairro Centro, deixando um rastro de destruição e deslocando milhares de pessoas. Os relatos detalhados dessa tragédia já nos apontavam não apenas a força da natureza, mas também a vulnerabilidade da cidade diante de eventos extremos.

Pensando nisso, na década de 1970, foi decidida a construção de um muro para proteção da cidade contra inundações de até 6 metros, o Muro da Mauá. A estrutura foi feita em concreto armado de 2,6 quilômetros de extensão e 3 metros de altura. Este obstáculo físico é para ser a última linha de defesa contra as águas. Porém, por muito tempo foi questionada a sua permanência e como afetava o visual da orla porto-alegrense.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem de Giulian Serafim, PMPA, reproduzido de CNN Brasil

Hoje entendemos a importância do Muro da Mauá. Porém, de alguma forma, ele não conseguiu cumprir bem o seu papel nas enchentes de 2024, quando o Guaíba atingiu a marca recorde de 5,3 metros. A falha do sistema, que também inclui 68 km de diques, 14 comportas e 19 casas de bomba, está sendo muito questionada. Afinal, o que deu errado? Será que houve negligência e falta de manutenção por parte das autoridades responsáveis? Fica o debate.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de Senge RS
Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de Blog do Moisés Mendes

Sobre o sistema de proteção contra enchentes de Porto Alegre

Durante o período mais triste da história de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul, ouvimos muito das autoridades de que não faltou manutenção, de que apenas o sistema de proteção de Porto Alegre é que não havia sido testado para nada igual.

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O fracasso do sistema

Longe de mim questionar se houve culpados ou não. Fato é que, assistindo às mudanças climáticas, já deveríamos prever cenários piores. E toda engenharia pode ser testada de antemão, sim, sobretudo com auxílio de softwares e cálculos. Do contrário, precisaríamos ver diversas quedas de avião para aprimorar as aeronaves, não é mesmo? Neste momento, temos esta estrutura emblemática, marco do nosso urbanismo e que virou símbolo de colapso.

Como dito antes, o Muro da Mauá não deveria agir sozinho para a proteção de Porto Alegre. Existem outros elementos fundamentais nesta equação. Primeiro, é claro, as comportas ou "portões metálicos" fechando este muro. Depois, os diques, margeando o Guaíba e contendo os arroios. E as dezenas de estações de bombeamento de água da chuva; e é aí que a coisa pegou.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de Prefeitura de Porto Alegre
Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem divulgação Prefeitura de Porto Alegre reproduzida de G1
Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem divulgação Dmae Porto Alegre reproduzida de G1

Causas do colapso

Pouco depois das águas do Guaíba ultrapassarem os 3 metros e das comportas serem fechadas, já recebemos imagens do centro, mais precisamente da zona ao lado do Mercado Público, com a primeira casa de bombas precisando ser desligada. Na sequência, muitas outras pararam, jogando o excesso de água para as ruas, ao invés de jogar de volta para o estuário. Uma das comportas chegou a se romper, na linha do bairro Navegantes. E os diques, como o da Fiergs e do Sarandi, se mostraram insuficientes, quase entrando em colapso sobre a pressão do volume de água.

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Especialistas apontam que o sistema como um todo, concebido décadas atrás, não estava preparado para lidar com os desafios atuais e o aumento na frequência e intensidade das chuvas.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de O Globo

"O sistema falhou miseravelmente", "As falhas se deram nos pontos de abertura do muro. A água passou por cima em alguns pontos. As comportas não foram bem vedadas. E no momento crucial não teve energia elétrica para bombear água de dentro para fora do sistema. Foi um descuido de décadas" - analisou Walter Collischonn, professor de engenharia ambiental da UFRGS, em reportagem de Deutsche Welle.

"Lamentavelmente, todo o sistema não teve uma manutenção adequada. As comportas já estavam bastante abauladas. Faltavam parafusos. Um dos portões veio abaixo com a força da água" - arquiteta Lígia Bergamaschi Botta, que acompanhou a construção do sistema nos anos 1970.

Os planos para o Cais Mauá e a substituição do Muro da Mauá

É inacreditável pensar que até pouquíssimo tempo atrás ouvíamos tanto sobre a revitalização do Cais Mauá com os planos de mudança desse sistema de proteção via abordagem flexível. A ideia era assinar um consórcio para implementar uma solução adaptável aos desejos da população (ou dos políticos, talvez) de permitir melhor contato visual com o Guaíba, liberar mais o acesso à orla, expandir a área central da cidade e criar mais espaços públicos dinâmicos.

No lugar do Muro da Mauá, teríamos diques móveis/removíveis ou diques temporários infláveis e elementos paisagísticos, como jardins e arquibancadas. É claro que este discurso quase utópico, de projeto mais inclusivo e sustentável, vai precisar ser refeito. Certamente, os novos estudos precisarão avaliar toda a viabilidade técnica e econômica de soluções muito mais potentes e resilientes para preservar a cidade e seu patrimônio histórico, antes de integrá-la ainda mais com o Guaíba.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de Zero Hora via Skyscrapercity
Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre
Imagem reproduzida de Zero Hora via Skyscrapercity

Rumo a um futuro mais resiliente e integrado

Nem preciso dizer quanto o povo porto-alegrense, canoense, leopoldense e mais está indignado com o que aconteceu. O cenário é desolador. Certamente nenhum discurso raso será mais aturado. Precisamos agora pensar em elevação do Muro da Mauá, modernização das comportas, implementação de tecnologias mais avançadas nas casas de bombas e uma série de outras soluções emergenciais. Além disso, gestão de riscos e planejamento urbano eficiente para evitar futuras catástrofes.

"No sul do Brasil, as estimativas são de que as cheias vão aumentar. O que está acontecendo nos últimos anos pode ser o cenário do século 21" - Collischonn.

Estrutura Muro da Mauá Porto Alegre

Nossa obrigação como sociedade é preservar esse legado; e neste contexto, a engenharia tem um papel crucial a desempenhar. Porto Alegre deve se reerguer lentamente. O que pesa é saber que isto acontecerá mediante o sofrimento de um povo que já vinha sofrendo muito por conta de tantas desgraças, incluindo a pandemia de 2019.


Fontes: G1, CNN, O Sul, Zero Hora.

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Simone Tagliani

Graduada nos cursos de Arquitetura & Urbanismo e Letras Português; técnica em Publicidade; pós-graduada em Artes Visuais, Jornalismo Digital, Marketing Digital, Gestão de Projetos, Transformação Digital e Negócios; e proprietária da empresa Visual Ideias.

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