Devido aos efeitos colaterais da agricultura industrial, por volta da década de 70, começaram a surgir diferentes correntes de movimentos de agricultura alternativa. Dentre elas, a ideia do que são agroflorestas, conceito que tem por objetivo realizar o plantio de árvores com culturas agrícolas, possibilitando assim a produção de alimentos e/ou produtos florestais enquanto inúmeros serviços ambientais são promovidos. Continue lendo este artigo do Engenharia 360 para saber mais!
O que são agroflorestas?
Agrofloresta ou sistema agroflorestal (SAF) é uma prática muito antiga, porém seu conceito surgiu na década de 70. Sistemas agroflorestais são combinações do plantio de espécies arbóreas com culturas agrícolas e/ou criação de animais, em um determinado arranjo temporal ou espacial, onde todos os componentes do sistema interagem ecológica e/ou economicamente.
São, portanto, sistemas mais complexos do que as monoculturas, no que tange aspectos ecológicos e econômicos. Portanto, um sistema agroflorestal pode ser constituído por árvores frutíferas, madeireiras, hortaliças, plantas medicinais, culturas nativas (funções ecológicas), criação de animais, plantas alimentícias não convencionais (PANCs), etc. Enfim, são inúmeras possibilidades de sistemas agroflorestais, que podem ser aproveitadas pelos agricultores e para a geração de renda.
Aplicações dos sistemas agroflorestais
Vamos voltar à explicação sobre o que são agroflorestas! Segundo a FAO, as agroflorestas podem ser classificadas, de acordo com seus componentes, em três principais tipos: silviagrícola, a qual constitui na combinação de árvores com culturas agrícolas; silvipastoril, que consiste na criação de animais com as florestas; e agrosilvipastoril, a qual utiliza os três componentes: criação de animais, culturas agrícolas e florestas. Ou seja, a floresta é o componente indispensável nesse sistema.
Como as agroflorestas fornecem muitos benefícios aos solos, existe uma forte tendência desse sistema ser orgânico. Entretanto, ao contrário do que pode se pensar, nem todo SAF é orgânico. Nesse aspecto, é importante ressaltar a classificação de acordo com a quantidade de insumos agrícolas externos utilizados, podendo essa ser baixa, média ou alta.
A saber, existem dois importantes modelos de sistemas agroflorestais com baixo uso de insumos agrícolas: a agricultura sintrópica e os SAFs agroecológicos.
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Agricultura sintrópica
Criada pelo pesquisador e agricultor suíço Ernst Götsch, a agricultura sintrópica é um tipo de prática agroflorestal baseada na sucessão natural, na qual não cabe a utilização de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Nesse sistema, segundo Pasini, até mesmo o uso de fertilizantes orgânicos e irrigação é mínimo.
Doenças e pragas são vistas como indicadores do sistema, e quando surgem, procura-se restabelecer o equilíbrio no local. O ser humano tem apenas o papel de acelerar o processo de sucessão natural, fazendo o uso intensivo do processo de poda e plantio de diversas espécies nos diferentes estratos vegetais, respeitando-se a mata nativa.
Já nos SAFs agroecológicos, tem-se como princípio a agroecologia, movimento social que engloba os saberes tradicionais à tecnologia e ciência, preocupando-se não apenas com a produção de alimentos, mas com todas as dimensões da sustentabilidade: ambiental, social, econômica, cultural, política e ética. Nos SAFs agroecológicos também não são utilizados agrotóxicos ou fertilizantes químicos.
O motivo pelo qual as agroflorestas têm ganhado tanta atenção ultimamente é pelo fato de que elas são um modo de produção de alimentos bem mais sustentável do que a agricultura convencional. Os sistemas agroflorestais trazem inúmeras vantagens para o solo, ar e água, as quais refletem na qualidade de vida dos agricultores e até dos consumidores dos alimentos provenientes de agroflorestas.
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Benefícios socioambientais das agroflorestas
Melhores propriedades físicas e químicas dos solos
As árvores, constituintes essenciais das diferentes categorias de sistemas agroflorestais, geram inúmeros benefícios ao meio ambiente. Elas têm o papel de devolver nutrientes ao solo por meio da queda de folhas, galhos e outras partes. Esse material gera uma cobertura vegetal, a qual protege o solo da exposição intensa a raios solares e chuva.
Dessa forma, os solos dos SAFs apresentam melhores propriedades físicas e químicas, inclusive, maior capacidade de retenção de água, quando comparados aos solos da agricultura convencional. Portanto, trata-se de uma técnica de recuperação de áreas degradadas, constituindo-se como uma forma estratégica de redução do desmatamento.
Recuperação e otimização de áreas de propriedades rurais
Além disso, por se tratar de um sistema regenerativo ao solo, as agroflorestas podem, por diferentes instrumentos legais no Brasil, ser implantadas em áreas de reserva legal e preservação permanente. Dessa forma, contribuem para o aumento da geração de renda do produtor, visto que promovem a recuperação de áreas e otimizam a área da propriedade rural, representando uma prática estratégica para a permanência do agricultor no campo.
Diminuição da necessidade do uso de agrotóxicos
Devido ao aumento da fertilidade e melhoria das características físico-químicas do solo, mesmo os SAFs não orgânicos, contribuem para a diminuição da necessidade do uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos, quando comparados à monocultura convencional. Dessa forma, os produtores terão uma redução de custos, além de diminuírem ou anularem o contato com essas substâncias químicas, o que beneficia positivamente a saúde dos produtores rurais.
Além disso, a diminuição do uso de agrotóxicos é benéfica para a população, que tem apresentado cada vez mais uma demanda por produtos orgânicos, e para o meio ambiente como um todo, que apresenta elevados índices de contaminação por essas substâncias nos solos e corpos hídricos provenientes da agricultura convencional.
Diminuição de emissão dos gases de efeito estufa
Os benefícios gerados por esse sistema não se restringem apenas aos solos. Os SAFs contribuem também para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Além da diminuição da necessidade do uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos, que são responsáveis por grande parte das emissões de gases de efeito estufa, as árvores, componente indispensável das agroflorestas, contribuem para o sequestro de carbono da atmosfera, mitigando assim os efeitos do aquecimento global. Com isso, existe também a possibilidade da implementação de projetos de captação de créditos de carbono, fomentando a renda dos produtores.
Melhora do microclima local e aumento da biodiversidade
As árvores desempenham papel fundamental na atenuação dos efeitos dos eventos climáticos extremos, gerando maior resiliência ao sistema produtivo, oferecendo, por exemplo, proteção contra vento. Promovem sombra para outras espécies mais sensíveis aos efeitos dos raios solares e contribuem para a redução da temperatura local, melhorando assim o microclima local, e logo, o bem-estar humano e animal.
Aliás, o sistema pode também contribuir para o reaparecimento de nascentes. Tudo isso afeta de forma positiva a produtividade e a qualidade de vida do agricultor e de sua família.
O conceito de agroflorestal, em si, já implica aumento da biodiversidade, quando comparado à agricultura convencional. Mas os efeitos sobre a biodiversidade não param por aí. Com a melhora do solo, o sistema contribui para um aumento significativo na presença de organismos abaixo e acima desse. Além disso, muitos sistemas assemelham-se à dinâmica de uma floresta natural, contribuindo para a biodiversidade animal, constatando, em alguns casos, até mesmo o reaparecimento da fauna silvestre.
Desenvolvimento sustentável das comunidades rurais
O cultivo de diversas espécies vegetais contribui também para o aumento da resiliência e diversidade da atividade comercial do agricultor, visto que ele possui uma gama de opções para comercializar, dentre elas, espécies alimentícias e outros produtos florestais, como castanhas, celulose, plantas medicinais, etc. Com uma ampla gama de produtos, o agricultor fica menos refém da infestação de uma praga, por exemplo.
Além disso, a diversidade de espécies contribui também para a segurança alimentar, garantindo alimentos in natura em quantidade, diversidade e qualidade para o agricultor e sua família. Muitos agrofloresteiros fazem inclusive o beneficiamento dos produtos em sua propriedade, incrementando assim o valor agregado de seus produtos.
Devido a esses inúmeros benefícios, os sistemas agroflorestais têm sido muito promissores no que tange à produção de alimentos e recuperação de áreas degradadas, contribuindo estrategicamente para o alcance do desenvolvimento sustentável.
Por que precisamos mudar o modo como lidamos com o meio ambiente?
A agricultura industrial desempenha um forte papel na economia brasileira, porém ocasiona inúmeros impactos negativos. Baseada na monocultura e no uso intensivo de fertilizantes químicos e agrotóxicos, acarreta poluição dos corpos d’água e solos.
As práticas realizadas pelo agronegócio causam também o esgotamento do solo, o que resulta em processos de desertificação, e consequentemente, na abertura de novas áreas agricultáveis, ou seja, mais desmatamento, impactando diretamente na biodiversidade. Além disso, de acordo com a FAO, a agricultura industrial com a de subsistência, é responsável por 70% de todo o consumo de água no planeta.
Os impactos negativos não se restringem apenas ao meio ambiente. O pacote tecnológico da agricultura (fertilizantes, agrotóxicos, máquinas, transgênicos...) custa caro para pequenos e médios produtores. Esses, muitas vezes, não conseguem arcar com os custos e acabam abandonando sua atividade no campo, o que pode acelerar o êxodo rural. Isso sem mencionar as elevadas concentrações de agrotóxicos nos alimentos, que impactam na saúde dos consumidores e, principalmente, na dos agricultores.
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Sobre a autora:
Graduanda em Engenharia Ambiental e Sanitária pela UFJF. Voluntária na rede Engenheiros sem Fronteiras desde 2017.
Larisse Cavalcante - Assessora de Captação de Recursos em Engenheiros sem Fronteiras Brasil.
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Engenheiros Sem Fronteiras Brasil
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