Engenharia 360

Física Quântica: um novo jeito de enxergar as leis naturais

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por Cristiano Oliveira da Silva
| 09/04/2021 | Atualizado em 29/07/2022 7 min

Física Quântica: um novo jeito de enxergar as leis naturais

por Cristiano Oliveira da Silva | 09/04/2021 | Atualizado em 29/07/2022

Entenda as bases que foram consideradas para o desenvolvimento e formulação da bela (e estranha) Teoria Quântica

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Entenda as bases que foram consideradas para o desenvolvimento e formulação da bela (e estranha) Teoria Quântica

Nos já apresentamos aqui no Engenharia 360 o cenário que motivou uma reformulação das bases teóricas da física. Nesse cenário, o empirismo trouxe à tona questões que não mais poderiam ser explicadas com as teorias clássicas disponíveis (física newtoniana e teoria clássica do eletromagnetismo). Einstein propôs as teorias restrita e geral da relatividade. Ainda assim, sua bela teoria não explicava uma série de fenômenos observados empiricamente, envolvendo radiação, linhas espectrais, efeito fotoelétrico (que ele explicou, mas não via relatividade).

Uma vez que se dispunham dessas observações empíricas, era necessária a criação de uma teoria que os explicasse. Surge então, a Teoria Quântica, que iremos apresentar na presente matéria.

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A dualidade onda-partícula e o experimento da dupla fenda

Sobre a natureza da luz... ela é onda (espectro com uma determinada frequência e comprimento de onda) ou é partícula (fótons)? Será que o elétron também apresentava essa dualidade?

Richard Feynman, além de um brilhante físico teórico, era conhecido por ser um cara um tanto quanto espirituoso. Ele considereva que era preciso engolir a Teoria Quântica como um todo, sem se preocupar com o gosto nem se seria possível digerí-la. Isso poderia ser feito engolindo-se o experimento da dupla fenda, pois:

"Na realidade, ele contém o único mistério. Não podemos fazer o mistério desaparecer "explicando" como ele funciona. Vamos apenas dizer como ele funciona. Ao dizer como ele funciona, as peculiaridades básicas de toda mecânica quântica serão ditas."

O experimento é muito simples: uma fonte bombardeia elétrons sobre uma placa que contém duas fendas e atrás dessa placa há uma tela de detecção dos elétrons que passaram pelas fendas. O índice de distribuição do bombardeador de elétrons é ajustado para que haja somente um único elétron atravessando o aparato de cada vez. Depois será observado o que acontece.

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Arranjo experimental dupla fenda - física
Arranjo experimental dupla-fenda

Os elétrons chegam à tela um por um, apresentando um comportamento corpuscular. No entanto, à medida que um grande número de marcas se acumula na tela de detecção, observamos um padrão muito conhecido e característico de interferência de ondas. Esse padrão de difração é uma assinatura irrefutável de que elétrons se comportam como ondas.

A Mecânica Quântica

Segundo Feynman (ele, de novo, que foi um profícuo conhecedor e usuário da física quântica), afirmara: "acho que posso dizer com segurança, que ninguém entende mecânica quântica".

A formulação da Mecânica Quântica foi apresentada por Paul Dirac em 1930, no trabalho Princípios da Mecânica Quântica e desde então é considerado um dos clássicos intelectuais do século XX.

Dirac era um ótimo professor, cujas palestras cativavam pela clareza e como expunha seus argumentos. Conta-se que raramente ele permitia-se um gesto levemente teatral: ele pegava um pedaço de giz e o quebrava em dois, posicionando os fragmentos em lados opostos. Dizia que classicamente existe um estado em que o pedaço de giz está "aqui" e um outro estado em que está "lá", e essas são as duas únicas possibilidades. Porém, substitua o giz por um elétron e, no mundo quântico, não há apenas estados "aqui" e "lá", mas uma vasta quantidade de outros estados que são misturas dessas possibilidades - um pouco de "aqui" e outro tanto de "lá", todos juntos. A Teoria Quântica permite a mistura de estados que classicamente seriam autoexcludentes.

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É essa possibilidade contraintuitiva de adição que distingue o mundo quântico do mundo cotidiano da física clássica. No jargão profissional, essa nova possibilidade é chamada de princípio da sobreposição.

Entender isso, vai ajudar a entender a equação de Schrödinger.

A Equação de Schrödinger

Werner Heisenberg e Erwin Schrödinger formularam as bases matemáticas de forma matricial e ondulatória, respectivamente. Suas contribuições foram significativas no sentido de organizar todo esse conjunto de novas ideias que despontara poucos anos antes das publicações de seus trabalhos.

Heisenberg teve como contribuição notável, além da formulação matricial, o Princípio da Incerteza: não é possível saber com exatidão a posição e a velocidade de um elétron simultaneamente. Outra forma de dizer isso: pode-se saber onde um elétron está, mas não o que ele está fazendo, ou pode-se saber o que está fazendo, sem saber onde ele está.

Assim como a mecânica clássica tinha o princípio fundamental da dinâmica, expresso pela equação F=m.a, a mecânica quântica precisava do seu princípio fundamental também.

A equação de Schrödinger, publicada em 1926, é a equação fundamental da Teoria Quântica. É um tipo bem direto de equação diferencial parcial e era mais fácil de usar do que a formulação matricial apresentada por Heisenberg.

Equação de Schrödinger
Equação de Schrödinger

Essa equação descreve como o estado quântico de um sistema físico muda com o tempo. Ela descreve o tempo de evolução da função de onda do sistema. Ela considera os possíveis estados que um sistema pode assumir, trazendo em si um caráter probabilístico. O princípio da incerteza, a dualidade onda-partícula e até a relatividade geral (embora Schrödinger não a tenha considerado) estão contempladas nessa formulação.

Em outras palavras, pode-se dizer que a realidade é descrita como uma onda de probabilidades, tendo como condição de contorno o estado atual. E mais: um determinado estado é obtido pela superposição de diferentes estados.

No caso do experimento da Dupla Fenda sendo explicado por esse viés, traz algumas questões interessantes. Por exemplo: quando um único elétron, indivisível, passa pelo aparato dupla-fenda, por qual fenda ele passa? Vamos chamar uma fenda de A e outra de B. Agora, iremos supor que ele passe pela fenda A. Se isso for verdade, então a outra fenda é irrelevante e poderia ser fechada temporariamente. Porém, se só a fenda A estiver aberta, ele não chegaria ao ponto médio da antepara (conforme observado), ou seja, seria mais provável que ele se encontrasse na parte em frente à fenda A. Invertamos o raciocínio para a fenda B e ocorre o mesmo. Assim, conclui-se que o elétron indivisível passou por ambas as fendas (Feynman disse que teríamos que engolir esse experimento, lembram?).

Em termos de intuição clássica, essa é uma conclusão realmente sem sentido. Entretanto, em termos de sobreposição da Teoria Quântica, ela faz sentido: o estado de movimento do elétron foi a adição dos estados "passando por A" e "passando por B".

E o gato, o que tem a ver com isso?

Schrödinger propôs um experimento mental para explicar o princípio da sobreposição de estados (ainda bem que era mental, caso contrário, as sociedades protetoras dos animais ficariam bem aborrecidas). Esse experimento é famoso e conhecido como "O Gato de Schrödinger".

O experimento consiste em colocar um gato dentro de uma caixa isolada, sem que fosse possível inspecioná-la sem abrir. Dentro dessa caixa, há algumas partículas radioativas (que podem ou não emitir radiação), um contator Geiger (dispositivo utilizado para medir radiação), um sistema mecânico ligado ao contador Geiger, um martelo e um frasco de veneno. Se houver emissão de radiação, o contador capta, aciona o mecanismo, quebra o frasco de veneno e o gato morre. Se não houver emissão, o gato permanece vivo.

arranjo do experimento mental do Gato de Schrodinger
Arranjo do experimento mental "o gato de Schrödinger"

Mas, se a caixa está fechada, como saber se o gato está vivo ou morto? De acordo com a Teoria Quântica, o gato está vivo-morto, que corresponde à superposição desses estados. A menos que alguém abra a caixa e observe o estado do gatinho, não é possível concluir se o gato está vivo ou morto. Esse é um paradoxo interessante, porque é uma das características dessa teoria que haja um observador e este interfere diretamente nos resultados dos experimentos. Absolutamente nada intuitivo se comparado à física clássica.

Não é possível concluir nada a respeito do gato, apenas dizer que seu estado atual é vivo-morto. Lembrem-se, é um experimento mental e explica muito bem como a Física Quântica é estranha e muitas vezes incompreensível de acordo com a lógica que fomos treinados a assumir.

Conclusões e novas teorias

Pelo que foi exposto, podemos concluir que a realidade nada mais é que o colapso de uma das infinitas possibilidades de uma função de onda. E essa realidade observada, precisa de um observador. Parece óbvio? Mas não é!

Pela física quântica, o observador passa a ter papel fundamental e lança luz sobre um tema metafísico mais profundo, que é a possibilidade de uma consciência superior. O leitor mais cético pode questionar essa afirmação, mas com certeza há muitos argumentos que sustentam esse fato. Amit Goswami, Ph.D em física quântica pela Universidade de Calcutá e Professor Emérito do Departamento de Física da Universidade de Oregon, USA, traz questionamentos desconcertantes e uma visão genial sobre o tema, por exemplo, o que é consciência, como ela se manifesta num domínio não-local, saltos quânticos aplicados à criatividade humana... Por hora, vamos deixar essas questões para um outro momento. Mas vale muito conhecer seus livros e publicações.

Fato é que a Física continua evoluindo desde aqueles anos gloriosos de 1920. As observações evoluíram, os aparatos experimentas foram ganhando maior complexidade, novos fenômenos sendo observados, tanto no universo micro, quanto no macro.

E as teorias continuam evoluindo para explicar esses fenômenos. Teoria quântica relativística e teoria de quântica de campos são tentativas de unificar essas teorias e chegar a uma teoria do tudo. Stephen Hawking foi um grande pesquisador nessa área e colaborou muito no entendimento da gravitação no universo micro e dos efeitos quânticos no universo macro. Seu livro "O Universo numa casca de noz" traz uma visão de onde atualmente se encontra o limite do conhecimento da física.

A computação quântica também está se desenvolvendo a todo vapor. Se na computação tradicional, o mundo gira em torno de "zeros" OU "uns", um bit quântico (qubit) passa a ser a superposição desses dois estados, isto é, ele pode ser "zero" E "um" ao mesmo tempo, aplicando o princípio da superposição. Os ganhos em tempo de processamento são absurdamente altos. É um grande desafio tecnológico e de engenharia é isolar esses qubits e controlá-los, uma vez que são partículas subatômicas.

bit classico e quantico
Bit Clássico e Bit Quântico (qubit)

Niels Bohr, certa feita, escreveu a um amigo:

"o mundo quântico não existe. Há apenas uma descrição física quântica abstrata. É errado pensar que a tarefa da física é descobrir como a natureza é. A física lida com o que podemos dizer da natureza."

Niels Bohr

Essa é uma verdade que precisamos aprender a lidar. Seria muita pretensão e arrogância querer explicar um Universo extremamente complexo com uma mente limitada num domínio de existência limitado por um pequeno espectro do continuum espaço tempo. Mas isso não impede que a curiosidade humana continue buscando essas respostas e trazendo cada vez mais entendimento sobre o funcionamento da natureza.

Referência: Teoria Quântica (John Polkinghorne)

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Cristiano Oliveira da Silva

Engenheiro Civil; formado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo; com conhecimentos em 'BIM Manager at OEC'; promove palestras com foco em Capacitação e Disseminação de BIM / Soft Skills.

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